terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Trabalho degradante não é o mesmo que condição análoga à de escravo

Trabalho degradante não é trabalho em condições análogas às de escravo. A lei trabalhista admite o trabalho em condições de risco à saúde ou à vida, desde que sejam pagos adicionais de insalubridade e periculosidade. Somente quando os benefícios não forem pagos, ou quando não houver condições mínimas de trabalho, saúde, segurança, alimentação, higiene, moradia e respeito, é que ocorrerá a conduta criminosa tipificada pelo artigo 149 do Código Penal.

Esse foi o entendimento firmado pela Justiça Federal do Pará ao absolver duas vezes, no intervalo de aproximadamente um ano, um fazendeiro das acusações de manter trabalhadores em condições análogas à escravidão em suas fazendas no interior do estado.

“Em duas decisões louváveis, a Justiça demonstrou que não se pode confundir trabalho rural com trabalho escravo e conteve o ímpeto punitivo dos órgãos de fiscalização do Estado”, avalia a advogada Thais Rego Monteiro, do Camargo Lima, Sinigallia e Moreira Lopes Advogados, que representa o fazendeiro.

A primeira acusação destacou a suposta contratação de mão de obra sem o devido registro em carteira, acomodação dos trabalhadores em locais desprovidos de condições mínimas de conforto, saúde e higiene e ausência de instalações sanitárias no local, entre outros. Já a segunda denúncia, de acordo com o Ministério Público Federal, teria encontrado 53 trabalhadores em condições precárias de trabalho. Uma dessas “precariedades” seria o fato de famílias de diferentes trabalhadores estarem acomodadas em um único alojamento, o que lhes tiraria a privacidade.

Em ambos os processos o juiz federal Omar Bellotti Ferreira, de Castanhal (PA), não viu provas dos abusos alegados pelo MPF e absolveu o fazendeiro das acusações.

“Não foram provados a omissão no pagamento de salários, o aliciamento de trabalhadores, o cerceamento da liberdade ambulatória, a manutenção de vigilância armada, a existência de coação física ou moral, a imposição de jornada de trabalho extenuante, nem tampouco a existência de servidão por dívidas”, atestou o juiz.

Quanto ao fato de o alojamento comportar um número excessivo de pessoas, Ferreira apontou que “a instrução processual mostrou que em verdade tratava-se de parentes do empregado Pedro Corrêa, o qual, em princípio, habitava imóvel na sede da fazenda unicamente com seus filhos. Aconteceu que um filho seu, Maciel Corrêa, levou a companheira grávida para morar com seus pais, uma vez que eles não tinham moradia própria. Convivia ainda na mesma casa um sobrinho (ou primo) daquele, cuja esposa (ou companheira) o estava visitando no momento da fiscalização”.

Para o juiz, essa situação ocorria por causa do “grau de afetividade” dos moradores, e não por eles “supostamente serem impossibilitados de dispor de alguma privacidade”. Logo, não há violação da dignidade humana, concluiu Ferreira.

Segundo a advogada Thais, é preciso diferenciar trabalho escravo do trabalho rural em grandes fazendas, e impedir a crescente generalização das condições criminosas estabelecidas no Código Penal.

“No Pará, os órgãos que fiscalizam a prática do trabalho escravo cometem muitos abusos. Antes de se apontar a existência desse crime, é preciso conhecer o tipo específico de trabalho desenvolvido pelos trabalhadores rurais, bem como as circunstâncias regionais e culturais em que estão inseridas essas pessoas. É preciso distinguir trabalho escravo − crime que deve ser combatido com veemência − do trabalho rural em grandes propriedades situadas no estado. Não se nega a existência, na prática, desse tipo penal. O que não se pode tolerar é a gravíssima generalização de acusados e acusações”, opina a advogada.

Imóvel adquirido de boa-fé não pode ser penhorado por dívida do antigo dono

I
Imóvel adquirido de boa-fé não pode ser penhorado por dívida trabalhista do antigo proprietário. Com base nesse entendimento, a Subseção II Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso contra a liberação da penhora de um imóvel comprado por uma professora aposentada antes do direcionamento da execução de dívida trabalhista contra anterior dono do bem, sócio da empresa executada.

Segundo o presidente do TST, ministro Barros Levenhagen, o acórdão segue a nova tendência da jurisprudência da corte no sentido de que, no exame de embargos de terceiros, não se considera presumida a má-fé por parte do comprador.

A decisão foi tomada no recurso em Ação Rescisória ajuizada pela professora, que alegou ser a legítima proprietária de um apartamento em Rio Grande (RS), adquirido em dezembro de 2005, quando não havia qualquer gravame sobre o imóvel. Ao tomar ciência da ação de execução e da penhora sobre o bem, ocorrida em junho de 2007, ela opôs embargos de terceiro à execução, buscando desconstituí-la.

O juiz da 3ª Vara do Trabalho de Pelotas (RS) negou provimento aos embargos ao entender que houve fraude à execução na doação feita pelo antigo sócio da empresa executada e a posterior venda do imóvel à professora. Essa decisão levou ao ajuizamento da rescisória pela aposentada, a qual foi provida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS).

De acordo com o TRT-4, a fraude não pode prejudicar terceiros de boa-fé, sob pena de se desestabilizar as relações jurídicas e a credibilidade do registro público imobiliário, cuja função é dar conhecimento dos ônus que envolvem os bens, presumindo-se a inexistência de gravames não levados a registro, conforme artigo 472 do Código de Processo Civil.

Ao analisar recurso do credor da dívida trabalhista contra a desconstituição da penhora, a SDI-2 destacou ser evidente que a professora adquiriu o imóvel antes do direcionamento da execução contra o sócio devedor, sendo adquirente de boa-fé. Para o relator, ministro Alberto Bresciani, para a caracterização da fraude, é preciso que seja demonstrada a má-fé do terceiro, que consiste na verificação de que, à época da alienação, ele sabia da execução e do estado de insolvência do devedor. A decisão foi unânime. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Absolvição criminal não dispensa cobrança tributária, diz TRF-4

A absolvição em processo criminal não retira responsabilidade tributária. Foi o que decidiu a 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região ao analisar o recurso de um ex-proprietário de um posto de combustíveis em Florianópolis para questionar uma execução fiscal.

O autor argumentou que foi absolvido em processo criminal paralelo de crime contra a ordem econômica e que essa seria a prova de que não mais administrava o estabelecimento durante os anos do endividamento.

Entretanto, para o relator da ação, o desembargador federal Joel Ilan Paciornik, não é possível aplicar ao caso o artigo 935 do Código Civil, segundo o qual as ações cível e penal são independentes até a decisão no juízo criminal, quando devem ser encerradas as discussões na esfera cível.

Para o magistrado, embora a defesa tenha alegado que o executado não era mais proprietário, tendo passado a administração legalmente a terceira pessoa, existem provas de que seguiu à frente dos negócios, o que invalida o argumento apresentado.

Por isso, a turma entendeu que a absolvição no processo criminal não se estende ao processo tributário. “No presente caso, o fato de ter sido absolvido em ação penal não lhe retira a responsabilidade tributária, tendo em vista que o recorrente mesmo reconhece que participava do quadro societário da empresa executada no período cobrado”, afirmou.

Como sócio, o ex-proprietário deixou de pagar quase R$ 20 mil em Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental, entre 2001 e 2005. A tarifa foi instituída pelo Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis em 2000, com o objetivo de fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente. Com informações da assessoria de imprensa do TRF-4.

domingo, 28 de dezembro de 2014

"Exagero na racionalização dos trabalhos dos tribunais prejudica cidadania"

O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, é o autor da tese que levou a corte a adotar uma das jurisprudência que mais causou polêmica nos últimos tempos. É a opção pelo Habeas Corpus de ofício contra o uso do HC substitutivo de recurso ordinário.
A quantidade de HCs que chega à corte é enorme, e o remédio encontrado pela 1ª Turma do STF, da qual Marco Aurélio faz parte, foi não conhecer mais do HC impetrado como substituto de recurso ordinário constitucional. E foi ele quem trouxe o meio termo: se o HC for impetrado onde caberia o recurso ordinário, a turma não deve conhecer, mas se houver violação á liberdade de ir e vir, a ordem deve ser concedida de ofício.
Criou-se o Habeas Corpus de ofício. A 2ª Turma não embarcou nessa tese, e muitos advogados reclamaram que o Supremo estava usando de subterfúgios teóricos para restringir sua própria competência penal. E quem sai prejudicado é o cidadão preso injustamente. Pouco mais de dois anos depois dessa movimentação jurisprudencial, o ministro Marco Aurélio comenta: “Se arrependimento matasse, hoje eu estaria morto”.
Advogados relatam que o Supremo tem usado decisões judiciais para sinalizar uma redução de sua jurisdição criminal, o que seria ilegítimo. Reclamam que as turmas estão ampliando o uso da Súmula 691, que impede a concessão de Habeas Corpus contra decisão liminar de relator do caso no Superior Tribunal de Justiça, e também que estão rejeitando HC quando há Recurso Especial já em trâmite no STJ. Ou quando a decisão condenatória já transitou em julgado.
E não são só os advogados. Na sessão do dia 9 de dezembro, o ministro Gilmar Mendes, da 2ª Turma, criticou a “moda na tentativa de esvaziar o Habeas Corpus”. O tema sempre opôs Gilmar e o vice-decano. O primeiro por entender que a tal jurisprudência defensiva rompe com uma tradição já quase bicentenária por causa do excesso de Habeas Corpus em trâmite. Marco Aurélio por defender que o excesso de HCs justificaria essa contenção jurisprudencial.
Hoje o ministro Marco Aurélio concorda com o colega e com os advogados. Afirma que, em nome da promoção de uma “racionalização” no uso do HC, o Supremo abusou do que o o ministro chama de “autodefesa” contra a sobrecarga de processos. “Para utilizar uma expressão que ouvi pela primeira vez do ministro Francisco Rezek, o Habeas Corpus foi muito barateado. Passou a ser praticamente Bombril”, disse em entrevista àConJur, fazendo alusão ao produto de "mil e uma utilidades".
Segundo Marco Aurélio, houve um “abuso no manejamento do Habeas Corpus”, e por isso o tribunal passou a delimitar mais as possibilidades de impetração. “Cabia uma racionalização, mas sem chegar a extremos”, afirma. “Em Direito o meio justifica o fim e não o fim ao meio. Se você pode chegar a um resultado tendo em conta o direito posto você chega. Se não pode, tem que recuar.”
O ministro recebeu a reportagem da revista Consultor Jurídico para conceder a entrevista que comporá seu perfil no Anuário da Justiça Brasil 2015. As conversas, anuais, já fazem parte do calendário do ministro Marco Aurélio, segundo ele mesmo, sempre um dos primeiros a atender o pedido.
Leia a entrevista:
ConJur — Muitos advogados reclamam que o Supremo tem restringido a própria competência penal por meio da jurisdição. Falam da jurisprudência do Habeas Corpus de ofício e de um endurecimento na aplicação da Súmula 691. O senhor concorda?
Ministro Marco Aurélio — Se arrependimento matasse, hoje eu estaria morto. 

ConJur — Como assim?
Marco Aurélio — Pela tese que eu suscitei de não se admitir o Habeas Corpus substitutivo do recurso ordinário constitucional, para três meses depois eu próprio chegar ao meio termo. E os antigos diziam que a virtude está no meio termo. As posições extremadas devem ser abandonadas. Mas de que forma? Admitindo o Habeas Corpus toda vez que estiver em jogo a liberdade de ir e vir do paciente, quer por estar na rua um mandado de prisão ou por ele já ter sido implementado. Mas a partir desse entendimento, a ótica de se adotar um rigor maior na adequaçaõ caiu tão a gosto que passaram, por exemplo, a apontar: se já transitou em julgado não cabia Habeas Corpus; se a decisão poderia ter sido impugnada, é o caso de ir para o STJ mediante o Recurso Especial. E se a parte não manejou o especial não cabe Habeas Corpus. Aí é diminuir muito a importância dessa ação nobre, de envergadura maior, porque prevista na Constituição, que é o Habeas Corpus. 

ConJur — Então os advogados têm razão: tem havido restrição à jurisdição criminal.
Marco Aurélio — A meu ver está havendo certo exagero na racionalização dos trabalhos em prejuízo da cidadania e dos cidadãos em geral. Ou seja, se está potencializando, para utilizar um português bem claro, a mais não poder, a autodefesa, tendo em conta a sobrecarga de processos. Mas a sobrecarga de processos não autoriza o órgão julgador a forçar a mão para se ver livre destes ou daqueles processos. O jurisdicionado não pode ser prejudicado.

ConJur — O que o senhor quer dizer com “exagero na racionalização dos trabalhos”?
Marco Aurélio – Ocorreu, e os impetrantes têm que admitir, um abuso no manejamento do Habeas Corpus. Para utilizar uma expressão que ouvi pela primeira vez do ministro Francisco Rezek, o Habeas Corpus foi muito barateado. Passou a ser praticamente Bombril. E cabia uma racionalização, mas sem chegar a extremos. Ou seja, adotando-se uma posição intermediária, que é a mais aceitável. Por isso é que eu disse que houve uma racionalização num enxugamento do número de Habeas Corpus. E em Direito o meio justifica o fim e não o fim o meio. Se você pode chegar a um resultado tendo em conta o direito posto você chega. Se não pode, tem que recuar.

ConJur — Ano passado o senhor voltou a criticar os colegas por atraso no início das sessões. Isso continua?
Marco Aurélio – Precisamos ser um pouquinho mais afeitos ao cumprimento dos horários. Mas hoje temos dois fenômenos que preocupam. Há uma cadeira vaga, reconheço. E tarda a designação daquele que a ocupará, porque o ministro Joaquim Barbosa se aposentou em agosto. Mas há duas coisas que me preocupam muito. O problema do horário, porque nós temos outros compromissos, o nosso trabalho não se limita à sessão. E a outra questão  é a existência de varias cadeiras vazias no Plenário. 

ConJur — Falta de quórum?
Marco Aurélio — Hoje, por exemplo, havia uma tropa de advogados para julgar uma matéria importantíssima, tendo em conta a inconstitucionalidade ou não – foi declarada a inconstitucionalidade pelo TJ do Rio – da possibilidade de se ter o contrato de alienação fiduciária registrado apenas no Detran. Ou seja, a notícia da alienação no certificado de propriedade. Os advogados vieram dos estados para o julgamento dessa ação. Por que não julgamos? Porque não havia oito integrantes no Plenário que participassem do julgamento. À época da velha guarda dificilmente se tinha uma cadeira vaga.

ConJur — O senhor atribui isso a alguma coisa?
Marco Aurélio — Atribuo à quadra vivenciada pelo Brasil. É uma quadra de abandono a princípios, de perda de parâmetros, de inversão de valores, em que o dito passa pelo não dito, o certo pelo errado. E o Supremo é a última trincheira da cidadania, ele deve dar o exemplo.

ConJur — O princípio da insignificância pode ser aplicado a réu reincidente?
Marco Aurélio — Veja, geralmente se articula o princípio da insignificância no caso de furto. Mas quanto ao furto, o juiz pode inclusive deixar de aplicar a pena e aplicar apenas a pena de multa, em se tratando de coisa furtada de pequeno valor. Também no campo da autodefesa se passou a confundir o problema do instituto da ausência de interesse na persecução criminal com uma disciplina que houve na Fazenda quanto às execuções fiscais. E aí essa disciplina apontou que em se tratando de execução menor do que R$ 20 mil, o processo de execução fica suspenso para aguardar-se outros débitos e aí haver a cumulação. Mas é uma disciplina administrativa que não repercute no campo penal. Mas passou-se a proclamar. A minha turma conclui dessa forma, por exemplo, no caso de descaminho, em que, quando o valor do tributo devido é inferior a R$ 20 mil, não há interesse do Estado acusador em ingressar com ação penal.

ConJur — Esse valor antes era de R$ 10 mil, não era? 
Marco Aurélio — Era R$ 10 mil e majoraram. Mas nós sabemos que a responsabilidade civil e a responsabilidade administrativa são distintas da responsabilidade penal. O pronunciamento no campo penal repercute nos outros campos se você declarar inexistente o fato ou que não houve autoria. Mas a recíproca não é verdadeira. O que decidido no campo administrativo ou civil não repercute no campo penal. As responsabilidades são diversas.

ConJur — Então não deveria haver critério objetivo para a insignificância?
Marco Aurélio — Não, não, não. E temos que perceber que há certos crimes em que não se pode cogitar da insignificância. Por exemplo, o crime praticado que se revele um crime militar. Nós não podemos, ante dois predicados das Forças Armadas, a hierarquia e a disciplina, cogitar de insignificância. Senão vai virar uma babel o quartel. Em segundo lugar, o instituto da insignificância é uma construção jurisprudencial. Então não podemos exacerbar essa construção.

ConJur — A discussão da exacerbação é recorrente, principalmente quando se trata de controle de constitucionalidade. O senhor acha que o Supremo tem exacerbado seu próprio papel? 
Marco Aurélio — Há um princípio que tem de estar presente, que é o da autocontenção. Quanto mais escassa a possibilidade de se reverter o quadro decisório, maior tem que ser o cuidado da decisão. Não é o fato de o Supremo não ter acima dele um órgão para rever as respectivas decisões que o levará a atuar fora das balizas reveladas pelo arcabouço normativo. E eu costumo dizer, principalmente quando em jogo outros Poderes, que quando o Supremo avança e extravasa certos limites ele lança um bumerangue que poderá voltar e bater na teste dele, o Supremo.

ConJur — A repercussão geral vem sendo tratada como um gargalo. O Supremo reconhece mais casos do que pode julgar. Deve haver limite para o reconhecimento?
Marco Aurélio — De inicio, não. Tem que haver uma conscientização quanto ao fato de que a repercussão geral veio como um filtro, para o Supremo de certa forma pinçar o que ele acha que deve julgar. Mas quando surge um instituto, a tendência é de se potencializar, de se acionar e se ter vários casos reconhecidos. Foi o que ocorreu. Estávamos numa situação crítica no Plenário que já foi resolvida: o Plenário não tinha tempo pra julgar recurso extraordinário com repercussão geral. Agora nós temos julgado e muito, numa produção que está surpreendendo a todos, porque deslocamos o que podíamos deslocar via regimento para as turmas, que são o Supremo dividido.

ConJur — Então o Plenário hoje está livre para discutir as questões mais importantes
Marco Aurélio — A tendência é que o Plenário só discuta questões de controle concentrado — processo objetivo pra declarar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei — e recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida.

ConJur — Na discussão sobre a existência ou não da repercussão geral, a divergência deve ser fundamentada? Ou basta que se diga “sim” ou “não”?
Marco Aurélio — Hoje é sim ou não. Eu fundamento todos e não deixo de me pronunciar, porque o tribunal admite que, em se omitindo o integrante no prazo de 20 dias, que é o prazo em que o processo fica na telinha do denominado Plenário Virtual, esse ato omissivo, como se pudesse haver, em termos de voto, ato omissivo, é no sentido de admitir-se a repercussão. Mas isso é muito ruim. Agora, claro que antes de o relator colocar o processo no Plenário Virtual ele deve exercer um crivo quanto aos pressupostos de recorribilidade. 

ConJur — Era isso o que estava sendo discutido no caso do Seguro de Acidente de Trabalho, não é?
Marco Aurélio — Isso, estamos votando essa matéria no caso do SAT, o Seguro de Acidente de Trabalho. Entre os pressupostos de recorribilidade tem um formal, que é capítulo próprio versando a repercussão nas razões do extraordinário. No caso concreto não havia. Mas mesmo assim temos quatro votos querendo julgar de qualquer forma. Se julgarmos de qualquer forma estaremos adotando uma posição conflitante com o que todos os gabinetes fazem. Agora mesmo acabei de julgar uma lista do presidente, de seis processos, em que ele negou o seguimento do extraordinário por não ter esse capítulo. Nesse caso nós presumimos o que normalmente ocorre, que o relator tenha apreciado e tenha concluído de forma positiva. Como é que num caso, só porque passou pelo Plenário Virtual e nós não apreciamos se há ou não o capítulo, podemos julgar um recurso extraordinário em que não há, como disse em Plenário, sequer uma vírgula, num arroubo de retórica eu disse isso, sobre repercussão geral?

ConJur — O uso do Plenário Virtual tem que ser ampliado?
Marco Aurélio — Não. Fui voto vencido quanto ao Plenário Virtual para essa finalidade. Passaram posteriormente a entender que poderia haver confirmação da jurisprudência num plenário virtual. Se você entende que pode haver confirmação, pode haver também suplantação. Entendo que o Plenário Virtual está, considerada a maioria, de bom tamanho e deve usar só a definição se há ou não a repercussão geral.

ConJur — O que acha da proposta de se redistribuir o caso depois que o tribunal reconhece a repercussão geral?
Marco Aurélio — Essa é a proposta do ministro Luis Roberto Barroso, e eu não concebo termos no mesmo processo dois relatores. Um para veicular o tema no Plenário Virtual e outro para relatar, uma vez admitida a repercussão, o recurso extraordinário. Não vejo em que ponto haveria o aspecto positivo nessa dualidade.

ConJur  Não faria diferença?
Marco Aurélio  O problema não está aí. Eu, por exemplo, me recuso a receber votos antes do pregão do processo e a remeter meus votos para os colegas. Disse outro dia, pilheriando, que eu não recebo porque sou um juiz muito sugestionável, sou muito voluntarioso. Não é o caso. Eu quero, na bancada, estar solto, sem ideia preconcebida. E se eu recebo algo já estruturado qual é a minha tendência? A lei do menor esforço, acompanhar o relator. E quero ouvir principalmente os senhores advogados, a sustentação da tribuna tem eficácia. E perceber as discussões no Plenário. O que eu noto atualmente é que a maioria já vai com o voto escrito. Eu prefiro, em termos de participação, o voto oral ou espontâneo.

ConJur — Isso de levar o voto pronto é um fenômeno recente, não é?
Marco Aurélio —  Os vogais sempre votaram no Supremo de improviso. Mesmo porque, devo confessar, não tenho tempo nem para confeccionar votos nos processos nos quais eu sou o relator, o que direi quanto a processos de colegas. A rigor se passa a ter, com confecção prévia, revisão em recurso em que não há a figura do revisor.

ConJur — E mesmo nos votos em que o senhor é relator, o senhor vota falando num gravador, não é? 
Marco Aurélio — Desde 1977. Eu estava na Procuradoria do Trabalho e comecei a utilizar o Ditafone e me adaptei muito a isso. O segredo de gravar é não querer ver o que você já gravou. Se ficar retroagindo a fita você se perde, e ao invés de ganhar tempo, você perde tempo. A gravação é uma marcha. E depois que eu gravo, tem uma moça aqui no gabinete que é a moça que mais me ouve na vida, porque ela degrava, o voto vai para um setor sensível do gabinete, que é o de revisão. Lá só trabalham moças, tem uma chefe, que tem um curso superior em português, e o setor faz a revisão do estilo, substitui palavras que não foram bem percebidas pela degravadora. E com isso, enquanto eu faço cinco votos, por exemplo, de processos nos quais sou o relator, porque não faço voto prévio em processo alheio, o colega talvez não faça um digitando ou escrevendo a mão. Por isso é que eu consigo atuar e agora mesmo estou na dianteira da estatística.

ConJur — Ano passado o senhor falou que tinha mais de 100 casos prontos pra julgar que não eram levados à pauta.
Marco Aurélio — Hoje eu tenho cerca de 85 casos. Já diminuiu bem, porque o atual presidente passou a me dar preferência, porque estou na reta final para a expulsória. De qualquer forma sou o juiz que tem mais casos liberados para julgamento. Eu nunca pedi a presidente algum pra colocar na pauta um processo meu, porque eu busco tratamento igualitário dos jurisdicionados.

sábado, 27 de dezembro de 2014

Empresa de mineração vai indenizar vizinha por barulho

O ruído da empresa em atividades rotineiras de extração, lavagem e transporte de produtos de mineração é ininterrupto desde 2005. Os moradores dos arredores das instalações da empresa sofriam com o funcionamento de britadeiras e outras máquinas, o trânsito intenso de caminhões e a grande quantidade de água empoçada, poeira e entulho.

A Mineração Vianini Ltda. deverá indenizar, em R$ 20 mil, uma dona de casa de São João del-Rei que morava na proximidade da empresa e foi afetada pela poluição sonora. A 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais reformou decisão de 1ª Instância.

Em ação ajuizada em 2012, R.A.A.R., de 30 anos, alegou que o ruído da empresa em atividades rotineiras de extração, lavagem e transporte de produtos de mineração é ininterrupto desde 2005. Segundo a dona de casa, os moradores dos arredores das instalações da Vianini no local sofriam com o funcionamento ininterrupto de britadeiras e outras máquinas, o trânsito intenso de caminhões e a grande quantidade de água empoçada, poeira e entulho.

A mineradora, de acordo com R., ignorou reclamações dos moradores e advertências da prefeitura e desobedeceu a normas ambientais quanto ao limite acústico permitido e às condições de higiene no seu entorno. A dona de casa e sua família desenvolveram diversos problemas de saúde e acabaram se mudando do local. R. afirma, ainda, que as perturbações acarretaram a desvalorização do imóvel. Ela pediu à Justiça uma indenização por danos morais e materiais.

A Vianini alega que iniciou suas atividades em 2006 e que elas se restringem à extração de quartzo, não geram ruído excessivo nem ultrapassam o horário comercial. Argumentou, ainda, que a própria dona de casa forneceu documento de compra e venda da casa que comprova que ela se mudou para lá apenas em 2011. A mineradora sustentou, além disso, que há outras empresas no local, entre elas, duas fábricas de pré-moldados, e afirmou que seu licenciamento ambiental está totalmente regularizado.

O pedido foi julgado improcedente. O juiz entendeu que, embora tenha avaliado a casa em R$ 162 mil, a proprietária a adquiriu por R$ 13,8 mil e a vendeu, menos de um ano depois, por R$ 136.999,99, não havendo, portanto, perda do valor do imóvel. Já o dano moral não ficou provado porque a empresa contestou com um laudo técnico o laudo da dona de casa, e os depoimentos das testemunhas foram contraditórios.

R. questionou a sentença. O relator do recurso, desembargador Luiz Carlos Gomes da Mata, da 13ª Câmara Cível, considerou que o barulho exacerbado que afeta o vizinho configurava dano moral indenizável. O magistrado ressaltou que a perícia trazida aos autos pela dona de casa era proveniente do poder público municipal e gozava de credibilidade e presunção de veracidade e as fotografias comprovavam a sujeira provocada pela mineradora.

"O alegado exercício regular de um direito não autoriza a prática de ilícitos contra os vizinhos. Uma coisa é estar situada em local permitido e com a documentação toda regularizada e outra coisa é analisar os problemas que são causados pela atividade legal exercida pela empresa", declarou, fixando a indenização por danos morais em R$ 20 mil. Aderiram ao voto os desembargadores José de Carvalho Barbosa e Newton Teixeira Carvalho.

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Empresa indenizará servente por servir almoço estragado em local impróprio para refeições

Um servente da empresa baiana Sertenge S. A. que afirmou ter sido submetido a situações degradantes durante o almoço, vai receber indenização no valor de R$ 10 mil. A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento ao agravo de instrumento pelo qual a empresa tentava destrancar recurso contra a decisão. Segundo o trabalhador, as condições sanitárias e alimentares eram impróprias para refeições pela ausência de padrões mínimos de higiene.

A condenação foi imposta pelo Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA). De acordo com a decisão, o empregado, para almoçar, era obrigado a entrar numa espécie de "curral" em grandes filas, exposto ao tempo, e recebia alimentação estragada, imprópria para o consumo. O refeitório tinha capacidade para 200 pessoas, enquanto o número de empregados era de aproximadamente 1.200, de modo que sempre havia superlotação.

Segundo a argumentação da Sertenge, não houve dano moral que justificasse o pagamento da indenização a que foi condenada. Diferentemente, o ministro Cláudio Brandão, relator do agravo de instrumento, explicou que, para a configuração do dano moral, basta que "sejam identificados os elementos que o caracterizam", não sendo necessária "prova da dor e do sofrimento suportados pela vítima".

Segundo o relator, a doutrina jurídica já consagrou o entendimento de que o direito à reparação não necessita de prova, uma vez que se "origina da própria ação violadora, cuja demonstração há de ser feita". O dano, esclareceu, "mostra-se presente a partir da constatação da conduta que atinge os direitos da personalidade".

Quanto ao valor da indenização, entendido pela empresa como arbitrado sem a observância ao princípio da razoabilidade, o relator afirmou que o valor de R$ 10 mil não se mostrava excessivo em relação à própria extensão do dano. Pelo contrário, entendeu que seria caso até de majoração, tendo em vista o "grave desrespeito imposto à dignidade do empregado, como trabalhador e como ser humano". Afirmou, porém, que mantinha o valor, devido à impossibilidade legal do agravamento da pena em prejuízo do réu (reformatio in pejus).

quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Professor demitido durante estabilidade receberá indenização substitutiva

Uma fundação educacional foi condenada ao pagamento de indenização substitutiva a um professor despedido durante período de garantia de emprego assegurada por acordo judicial. A condenação é da 1ª Vara do Trabalho de Governador Valadares (MG) e mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG).
Segundo o TRT-3, o acordo judicial, firmado entre a instituição e o Sindicato dos Professores do Estado de Minas Gerais (Sinpro), garantiu estabilidade aos professores em dedicação integral por 60 meses, a partir de agosto de 2009. No entanto, ele foi dispensado em julho de 2013.
A corte regional esclareceu que é possível a substituição do direito à garantia provisória de emprego por indenização dos salários do período correspondente, "sem que haja necessariamente pedidos sucessivos de reintegração ao emprego ou indenização substitutiva", uma vez que não houve renúncia tácita à estabilidade provisória. Assim, mesmo a instituição tendo convocado o professor para retornar ao trabalho, ele não estava obrigado a voltar (artigo 489 da Consolidação das Leis do Trabalho).
Recurso
A fundação interpôs agravo de instrumento na tentativa de trazer a discussão para o Tribunal Superior do Trabalho, mas a 5ª Turma do TST negou-lhe provimento. O ministro Emmanoel Pereira, relator, explicou que, diante do descumprimento do acordo judicial pela própria instituição, o TRT-3 considerou inviabilizada a continuidade da relação de emprego, sendo incabível a reintegração defendida pela fundação.
Avaliando que a decisão regional não violou nenhum dispositivo constitucional apontado pela instituição, o relator negou provimento ao agravo de instrumento, ficando mantida a condenação. A decisão foi por unanimidade. Com informações da Assessoria de Imprensa do TST.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

Por embalagem idêntica, empresa deve repassar todos seus lucros ao concorrente

O lançamento de qualquer produto com embalagem idêntica à do concorrente provoca confusão ao consumidor e, portanto, consiste em concorrência desleal. No caso de um medicamento, o rigor deve ser ainda maior. Com esse entendimento, a 2ª Câmara de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina determinou que o laboratório MDC Pharma repasse à Aché todos os lucros que teve com a venda de um soro nasal similar.

Segundo a decisão, a embalagem do Soriflux tem as mesmas características que o concorrente Sorine: fundo azul-claro, desenho de arco-íris e marcas escritas com tipologia parecidas e na mesma cor, localizadas na parte superior. Por isso, o colegiado reformou sentença que obrigava a ré a ressarcir apenas 30% de seus lucros. O valor total da indenização ainda não foi definido.

A Aché alegava que vinha sendo prejudicada, enquanto a MDC Pharma dizia que a autora tinha exclusividade apenas para usar o nome do produto que fabrica. A ré alegava que não havia risco de o consumidor se confundir, porque os medicamentos somente são vendidos sob prescrição médica e não podem ficar expostos ao alcance das mãos dos clientes.

O desembargador Luiz Fernando Boller, relator do acórdão, discordou da empresa ré. Embora tenha reconhecido que a simples utilização de radical idêntico na nomenclatura (“sori”) não caracteriza ofensa ao direito de propriedade, ele concluiu que havia problema na venda de embalagens semelhantes.

Para Boller, é possível que consumidores tenham pensado que compraram produto “de laboratório com maior credibilidade no cenário nacional, quando, em verdade, não o era”. “Assim, a utilização das embalagens na forma como foi procedida — mesmo que por curto espaço de tempo —, não pode ser permitida”, afirmou ao votar que a ré banque os prejuízos materiais suportados pela autora.

Sem dano moral
O relator negou, porém, tentativa da Aché de ser indenizada por danos morais. Segundo Boller, “o conceito comercial da autora como titular da marca no mercado não restou desmoralizado, pois vale dizer, não perdeu o prestígio perante a sua clientela, inviabilizando o concreto abalo de ordem moral que alega ter sofrido”. A decisão foi unânime. Com informações da Assessoria de Imprensa do TJ-SC.

Estado só é obrigado a fornecer remédio gratuitamente a pessoa pobre

A Constituição Federal é clara ao dispor sobre a obrigação do estado de propiciar às pessoas o direito fundamental à saúde, de modo que todos os entes federativos têm o dever solidário de fornecer gratuitamente medicamentos ou congêneres à população carente. Seguindo esse entendimento, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça desobrigou o estado do Rio Grande do Sul a fornecer medicamento de alto custo a um paciente comprovadamente com boa condição financeira.

O entendimento foi aplicado pelo TJ-RS ao reformar sentença e negar o custeio do remédio por parte do estado. De acordo com o TJ gaúcho, não se tratava de pessoa carente, uma vez que as condições financeiras do paciente, que tem vários bens e elevadas aplicações financeiras, são mais do que o bastante para a compra do medicamento de que necessita.

O paciente recorreu ao STJ. Em decisão monocrática, o relator do Agravo em Recurso Especial, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, deu provimento ao recurso para restabelecer a sentença de primeiro grau, que condenou o estado a fornecer o medicamento. O estado interpôs Agravo Regimental para o caso ser analisado pela 1ª Turma.

Ao julgar a questão no colegiado, o relator reiterou seu entendimento de que houve equivocada valoração da prova pelo tribunal gaúcho, que não considerou a possibilidade de o paciente ter de se desfazer de bens para arcar com os custos do tratamento, comprometendo seu sustento e o de sua família. O entendimento foi acompanhado pelo ministro Sérgio Kukina.

Voto vencedor
A ministra Regina Helena Costa divergiu do relator. Em seu voto, ressaltou que a Constituição Federal é clara ao dispor sobre a obrigação do estado de propiciar às pessoas o direito fundamental à saúde, de modo que todos os entes federativos têm o dever solidário de fornecer gratuitamente medicamentos ou congêneres à população carente.

Para a ministra, não houve errônea valoração do conjunto probatório. Em seu voto, afirmou que o TJ-RS, após exame dos fatos contidos nos autos, concluiu não se tratar de pessoa carente, ressaltando suficientes condições financeiras do paciente para a aquisição do medicamento, porque possui "expressivo patrimônio".

Para ela, rever o acórdão recorrido para reconhecer a pretensão quanto à necessidade de intervenção do estado para garantir a sobrevivência do paciente demandaria o revolvimento de matéria fática, o que é inviável em Recurso Especial.

“Possuindo o autor plenas condições financeiras de arcar com o tratamento em discussão, não há que se falar em obrigação do estado, merecendo ser reformada a sentença”, concluiu a ministra. Seu voto foi seguido pelo ministro Benedito Gonçalves e pela desembargadora federal convocada Marga Tessler. Assim, por maioria, a turma deu provimento ao Agravo Regimental para não conhecer da pretensão, isto é, não examiná-la no mérito. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

2ª Turma do STJ permite que empresa em recuperação participe de licitação

As empresas em recuperação judicial têm o direito de participar de licitações, mesmo com a exigência da Lei de Licitações (Lei 8.666/93) de que os participantes da apresentem “certidão negativa de falência ou concordata”. Assim decidiu a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, seguindo entendimento do ministro Mauro Campbell Marques (foto), que relativizou as exigências documentais previstas em lei, para que uma empresas em recuperação tenha a chance de realmente se recuperar.

Ao votar nesta quarta-feira (17/12), Campbell apontou jurisprudência da corte no sentido de permitir que as companhias em recuperação consigam parcelamento tributário sem a comprovação de regularidade tributária — nos termos do artigo 57 da Lei 11.101/2005 e do artigo 191-A do Código Tribuátio Nacional — diante da inexistência de lei específica a disciplinar o parcelamento da dívida fiscal e previdenciária de empresas em recuperação.

No caso, discutia-se a possibilidade de uma empresa de informática do Rio Grande do Sul, que vive apenas de licitações, manter-se no mercado. O Tribunal de Justiça do estado havia permitido que a companhia participasse de concorrências sem apresentar o documento exigido. O Ministério Público recorreu ao STJ, pedindo que a decisão fosse suspensa, afirmando que havia pariculum in mora, ou seja, risco na demora da suspensão da decisão. Segundo o órgão, a empresa poderia ganhar uma concorrência e, posteriormente, deixar o Poder Público sem o serviço.

O ministro Humberto Martins concedeu a liminar pedida pelo MP, no dia 6 de novembro. No julgamento desta quarta, Campbell abriu a divergência, no que foi seguido por dois de seus colegas. O ministro discordou do argumento do MP, e disse que, no caso, o que há é uma possível ocorrência de “periculum in mora inverso”, pois, como a companhia foca sua atividade empresarial em contratos com os entes públicos, “a subsistência da liminar em tela poderá comprometer a sua existência”.

Logo, o ministro conclui que, se deferido o pedido do Ministério Público, “haverá grandes possibilidades da pessoa jurídica não mais existir, porquanto, impossibilitada de dar prosseguimento à suas atividades comerciais”.

Campbell levou em conta o artigo 47 da Lei 11.101/2005, que define: “A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica”.

Ficaram vencidos os ministros Humberto Martins e Hermann Benjamin, que votaram pela impossibilidade de a empresa participar das licitações sem apresentar todos os documentos exigidos.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Aposentado vítima de empréstimo fraudulento em seu nome será indenizado

O autor recebe benefício previdenciário e teve descontos efetuados indevidamente relativos a contrato de empréstimo consignado que nega ter celebrado.

Foi declarado inexistente o contrato de empréstimo celebrado entre um aposentado e o Banco Mercantil do Brasil S.A.. A juíza Kátia Cristina Guedes Dias, da Vara Cível da Comarca de Apodi, condenou, ainda, a instituição financeira a pagar o valor de R$ 5 mil, à título de danos morais, acrescidos de juros e correção monetária, a partir da publicação da sentença. Ela determinou ainda a restituição, pelo Banco, da quantia de R$ 4.982,68 ao autor da ação judicial.

O autor ingressou com Ação de Inexistência de Relação Jurídica cumulada com Ação Indenizatória por Danos Materiais e Morais com pedido de Antecipação de Tutela, contra o Banco Mercantil do Brasil S/A, com o objetivo de obter o ressarcimento de ordem material, em decorrência dos descontos efetuados indevidamente do benefício previdenciário recebido pelo autor relativos a contrato de empréstimo consignado que nega ter celebrado. Requereu também indenização por danos morais.

Uma decisão liminar favorável ao aposentado já havia determinando a suspensão dos descontos referentes ao empréstimo indicado no processo. E quando analisou o mérito da ação, a magistrada viu claramente que o autor tem razão, na medida em que não foram apresentados outros documentos capazes de demonstrar a licitude da relação contratual formulada em seu nome junto a instituição financeira.

Em sua defesa, o banco inicialmente negou a realização de transação fraudulenta, alegando que na ocasião de celebração do contrato foram tomadas todas as cautelas devidas. Além do mais, buscou afastar sua responsabilidade sobre eventual fraude reputando ausente a existência de nexo causal entre o dano sofrido pelo autor e a conduta praticada pelo banco.

Entretanto, a juíza Kátia Cristina Guedes Dias ressaltou que caberia à instituição financeira demonstrar que foi o autor quem contratou o empréstimo consignado, o que poderia muito bem ser feito mediante a apresentação dos documentos que foram apresentados por ocasião da assinatura do contrato.

No entanto, os documentos apresentados pelo banco provam exatamente as alegações do autor, uma vez que as assinaturas apostas no contrato e os documentos de identificação divergem completamente dos documentos pessoais apresentados pelo idoso.

"Porém, muito embora saibamos da possibilidade de a demandada ter sido vítima de uma fraude e que sofreu prejuízos, é inadmissível que o autor, que não tem absolutamente nada a ver com a ocorrência, seja penalizado pela desídia dos prepostos da instituição bancária no dever de cautela inerente aos riscos que envolvem o seu ramo de atividade", decidiu

domingo, 21 de dezembro de 2014

Instituto terá de custear tratamento de alto custo contra catarata

A paciente se submeteu à cirurgia de catarata, mas agora precisa passar por um procedimento diferente, com aplicação de injeções nos olhos, para não perder totalmente a visão. A terapia custaria, no mínimo, R$ 30 mil, e a mulher não tem condições financeiras para arcar com a despesa.

O Ipasgo terá de custear um tratamento de alto custo a uma beneficiada, sob pena de multa diária de R$ 3 mil. A decisão liminar é da juíza Maria Antônia de Faria, da Vara de Fazendas Públicas, Registros Públicos, Crime Ambiental, Família, Sucessões e 2ª Cível. A paciente se submeteu à cirurgia de catarata, mas agora precisa passar por um procedimento diferente, com aplicação de injeções nos olhos, para não perder totalmente a visão. A terapia custaria, no mínimo, R$ 30 mil, e a mulher não tem condições financeiras para arcar com ela.

Para deferir a medida, a magistrada considerou risco grave à saúde da segurada, ao analisar os atestados médicos relacionados ao processo. "No confronto entre o valor constitucional (vida/saúde) e questões orçamentárias, para o fim de custear tratamento que, ao que tudo indica, é indispensável ao requerente, deve prevalecer o primeiro, com a incidência do princípio da proporcionalidade. A vida e o direito à saúde são direitos inalienáveis, os quais se sobrepõem a quaisquer outros, devendo em casos tais ocorrer a antecipação da tutela"

O medicamento injetado é considerado de ponta, e é indicado para casos graves de catarata, a fim de impedir o aparecimento de novos vasos que obstruam a retina. Chamado de tratamento antiangiogênico associado à fotocoagulação, cada injeção custa, em média, R$ 5 mil, e seriam indicadas para o caso da paciente no mínimo seis, sendo três para cada olho.

sábado, 20 de dezembro de 2014

Mulher que perdeu residência em alagamento tem pedido de indenização negado

A autora havia ajuizado ação contra o Poder Público com a alegação de que a Prefeitura não teria efetuado obras necessárias para evitar alagamentos decorrentes das águas das chuvas.

A sentença da Comarca de Capivari que julgou improcedente pedido de indenização de moradora que teve sua casa destruída em uma inundação foi confirmada pela 2ª Câmara de Direito Público do TJSP.

A autora havia ajuizado ação contra o Poder Público com a alegação de que a Prefeitura não teria efetuado obras necessárias para evitar alagamentos decorrentes das águas das chuvas.

Em voto, a relatora Vera Angrisani afirmou que a residência da apelante foi construída em área de risco, sem autorização municipal, e que o volume de chuvas registrado entre os anos 2009 e 2010 se deu acima do normal, portanto um fato imprevisível. "Pela documentação acostada aos autos, a edificação que a autora alegou ter perdido não teve sua regularidade comprovada. Aliás, sua conduta pode ser considerada como causadora do dano, pois construiu sua residência em local proibido, qual seja, área de preservação permanente e de risco, não podendo agora se voltar contra o Estado pelos danos causados à sua morada."

Os desembargadores Renato Delbianco e José Luiz Germano participaram do julgamento, que teve votação unânime.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Companhia aérea é condenada por atraso de voo, perda de conexão e extravio de bagagem

A passageira alegou que, devido à falha da empresa, sofreu prejuízo financeiro, em relação a uma diária de hotel perdida, e dano moral, por conta dos aborrecimentos.

A companhia aérea Tam foi condenada pelo juiz do 1º Juizado Especial Cível de Brasília a pagar à passageira o valor de R$ 1.109,89, a título de indenização por danos materiais, e R$ 4 mil, por danos morais, devido a atraso de voo contratado, perda da conexão referente ao trecho de ida e extravio temporário de bagagem em viagem. A passageira alegou que, devido à falha da empresa, sofreu prejuízo financeiro, em relação a uma diária de hotel perdida, e dano moral, por conta dos aborrecimentos.

O juiz decidiu que não há dúvidas quanto ao fato de que houve atraso no voo contratado, o que ensejou a perda da conexão e embarque, que ocorreu apenas no dia seguinte. Em relação ao extravio da bagagem, os fatos foram documentalmente comprovados e confessados pela Tam. O juiz entendeu que houve falha na prestação do serviço na modalidade fortuito interno que se caracteriza por fatos e eventos imprevistos, mas que têm relação com a atividade desenvolvida pela empresa, impedindo o regular cumprimento do contrato.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Proprietário de casa indenizará inquilina despejada sem qualquer ordem judicial

A mulher foi surpreendida com caminhão estacionado em frente a sua casa, e de repente o réu e alguns homens começaram a retirar seus bens.

O proprietário de uma casa localizada no norte do Estado foi condenado pela 4ª Câmara de Direito Civil do TJSC ao pagamento de indenização por danos morais e materiais, no valor de R$ 12 mil, em benefício de locatária que tinha contrato verbal de aluguel do imóvel, mas acabou despejada de inopino, sem determinação judicial.

A mulher contou que foi surpreendida com caminhão estacionado em frente a sua casa, e de repente o réu e alguns homens começaram a retirar seus bens. Declarou que o fato causou profundo abalo moral, além de danos materiais decorrentes da danificação de alguns móveis em razão do mau acondicionamento no caminhão.

Em sua defesa, o locador alegou que o contrato verbal que mantinham havia sido rescindido, e somente auxiliou a autora a realizar a mudança de residência. Quanto aos móveis, assegurou que já estavam danificados em razão do uso. O filho do proprietário sustentou que a família chegou a oferecer dinheiro para a inquilina fazer a mudança, mas, como ela se recusava a sair, tiveram de tomar uma atitude.

O desembargador Joel Dias Figueira Júnior, relator da matéria, com base nas informações dos autos, concluiu que o réu cometeu ato ilícito ao exercer arbitrariamente suas razões, submetendo a autora a cena vexatória. "Não importa para o deslinde da questão se a demandante negava-se a desocupar o imóvel, mormente porque há medidas judiciais cabíveis para tanto e das quais optou o requerido por não se utilizar, como deixam claro as declarações de seu filho à imprensa", completou. A decisão foi unânime.

Plano de saúde cobrirá preservação de sêmen de jovem com câncer

Plano de saúde não é auxílio-doença e deve proteger a constituição familiar. O entendimento, inédito em Pernambuco, foi do juiz Rafael de Menezes, da 8ª Vara de Justiça da Capital ao julgar o pedido de um jovem de 19 anos, com câncer no sistema linfático, para ter os custos do procedimento de congelamento de sêmen totalmente cobertos pelo seu plano de saúde. O paciente havia requisitado a cobertura do plano na preservação do sêmen, mas o pedido foi negado pela empresa.

“Restou demonstrado, através de contrato firmado entre as partes, que a demandada cobre ações destinadas ao planejamento familiar, a fim de garantir direitos à constituição de prole”, ressaltou o juiz na sentença, já que no contrato de prestação de serviço da operadora de saúde do paciente, a Unimed Recife, há uma cláusula de proteção à família. Além disso, o juiz desmontou a justificativa da Unimed para ter negado o procedimento: “Quanto à recusa administrativa da ré, o fato do procedimento não estar listado no rol previsto pela ANS não caracteriza motivação idônea, haja vista que este rol é meramente exemplificativo”.

“Julgo que presentes estão os requisitos para concessão da antecipação da tutela, a fumaça do bom direito e o perigo da demora, tendo em vista que o autor deve se submeter o mais rápido possível ao tratamento quimioterápico, mas não sem antes realizar a preservação de espermas”, reforçou o juiz.

Com isso, Rafael de Menezes determinou a autorização da criopreservação do esperma (ou seja, o congelamento do sêmen) no prazo de três dias, por conta da urgência da necessidade de o jovem se submeter à quimioterapia e ao fato de que a preservação de seu material genético deve ser feita antes da sessão de tratamento. Além disso, determinou que, na hipótese de descumprimento da decisão, a Unimed sofrerá pena diária de R$ 1 mil.

O caso abre jurisprudência no estado de Pernambuco. De acordo com Izes Mendonça, advogada da Associação de Defesa dos Usuários de Planos de Saúde de Pernambuco (Aduseps), entidade que assiste o paciente, a ação se fundamentou em três teses: a primeira — e principal — é o direito de proteção à entidade família; a segunda, a proteção à prole; e a terceira, a proteção à felicidade.

“Esse paciente é muito jovem, tem um linfoma remissivo e já se submeteu a dois tratamentos. Agora, ele vai ter que passar por todo o tratamento quimioterápico e a médica que cuida dele disse que ele já poderia ficar estéril depois da terceira sessão. Diante disso, o paciente quis resguardar sua prole, já pensando em, no futuro, curado, constituir uma família.”

A Unimed Recife ainda pode recorrer. No entanto, a advogada acredita que seja difícil o Tribunal de Justiça de Pernambuco reformar a decisão: “O que fez o juiz deferir a liminar foi o artigo 226 da Constituição Federal, a cláusula contratual e a proteção aos três axiomas utilizados na ação”, ressaltou ela, indicando a força das teses utilizadas.

Ainda segundo a advogada, não se discutiu o método de constituição familiar que será adotado pelo jovem, mas a decisão representa um avanço no direito à prole e à família. “O plano vai custear tudo porque esse tipo de direito não se resume só à preservação do material genético, também diz respeito à inseminação artificial. A empresa será responsável pela preservação desse material até que ele seja utilizado”, concluiu.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Bancos não podem questionar ordem de cliente para sustar cheques

Bancos não podem questionar a ordem de cliente para sustar o pagamento de cheques. Foi com esse entendimento que a 2ª Câmara de Direito Comercial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina deu provimento parcial à apelação de um correntista do Banco do Brasil que acabou inscrito em cadastro de inadimplentes, depois de ter dois cheques devolvidos por falta de fundos. Os cheques estavam entre os 33 que o cliente mandou o banco sustar.

O relator do caso, desembargador Luiz Fernando Boller, explicou que o cliente não tem a obrigação de emitir qualquer juízo sobre o que o motivou a sustar o pagamento. “A lei assegura ao emitente a faculdade de sustar a respectiva quitação, desde que manifestada tal intenção por escrito, diligência esta efetivamente encetada pelo autor apelante, que, malgrado isto, foi indevidamente inscrito no rol de maus pagadores, suportando, inclusive, tarifas relativas à ulterior devolução dos títulos por insuficiente provisão de fundos”, diz Boller.

A 2ª Câmara instituiu a indenização em R$ 15 mil, acrescida de juros de mora a contar da data do evento, além de custas e honorários advocatícios em 15% sobre o valor atualizado da condenação. A decisão foi unânime.

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Contagem de prescrição só começa com recebimento da denúncia, diz STF

A contagem de tempo para o Estado punir um criminoso vale a partir de quando a denúncia é recebida, e não mais com base na data em que o crime foi cometido. A regra, fixada pela Lei 12.234/2010, foi considerada constitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na última quarta-feira (10/12), como uma estratégia do legislador para evitar a prescrição.

A Defensoria Pública da União buscava o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva a um militar condenado a um ano de prisão por ter furtado a motocicleta de um colega de farda. Como a denúncia só foi recebida dois anos depois do fato, a Defensoria alegava que o réu não poderia ser mais punido.

Até 2010, o condenado podia usar a pena aplicada como parâmetro para calcular a prescrição entre a data do fato e o recebimento da denúncia. Mas o Superior Tribunal Militar negou o pedido, porque a Lei 12.234/2010 extinguiu essa regra, ao alterar o parágrafo 1º do artigo 110 do Código Penal.

Em Habeas Corpus apresentado ao Supremo, a DPU queria que a corte declarasse a inconstitucionalidade dessa mudança, por entender que a lei “trouxe um alargamento exagerado que fere a razoável duração do processo” e viola os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da segurança jurídica.

Já o relator do processo, ministro Dias Toffoli (foto), avaliou que a alteração legislativa é constitucional, justa e eficaz, pois “veio a se adequar a essa realidade material do Estado na dificuldade de investigar e apresentar uma denúncia a tempo”, reduzindo a probabilidade de que o responsável pelo crime deixe de ser punido.

Tempo flexível
Toffoli avaliou que “os limites temporais da investigação (...) não podem ser condicionados a um prognóstico de imposição de pena no mínimo legal”. “Para bem cumprir sua finalidade, a investigação poderá demandar o tempo que se fizer necessário para a apuração do fato, suas circunstâncias e autoria, respeitado o prazo de prescrição pela pena máxima em abstrato cominada ao delito”, afirmou em um longo voto de quase 50 páginas.

O ministro disse ainda que o legislador tem “legitimidade democrática para escolher os meios que reputar adequados para a consecução de determinados objetivos, desde que não lhe seja vedado pela Constituição e nem viole a proporcionalidade”.

A decisão foi por maioria de votos, vencido o ministro Marco Aurélio. Ele considerou que o Estado deve oferecer infraestrutura à policia judiciária, ao Ministério Público e ao Judiciário, de forma a viabilizar a eficácia do direito que o cidadão tem de ver o término do processo em um prazo razoável. Com informações da Assessoria de Imprensa do STF.

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