segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Audiências com sobreviventes do incêndio na boate Kiss serão retomadas em setembro

As novas audiências para ouvir mais sobreviventes do incêndio ocorrido na boate Kiss, em 27/1, já estão marcadas. As oitivas ocorrerão nos dias 5/9, 10/9, 11/9, 12/9, 19/9, 24/9, 25/9, 26/9 e 27/9. Ao todo, 52 testemunhas serão ouvidas pelo Juiz de Direito Ulysses Fonseca Louzada, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Santa Maria, que conduz o processo criminal que apura a tragédia. 

A decisão é desta terça-feira (20/8), quando o magistrado decidiu ainda sobre outros pedidos feitos pelas defesas dos réus Elissandro Callegaro Spohr, Mauro Londero Hoffmann, Luciano Augusto Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos.

Degravação

A defesa de Elissandro, um dos sócios da danceteria, pediu a degravação das audiências até agora realizadas no processo, que foi negado. O Juiz entendeu que não existe motivo razoável para atender o pleito nesse momento.

Endereços

Na primeira fase de audiências, quatro testemunhas convocadas não foram ouvidas, seja pela sua não localização, seja pela necessidade de mudança de horários designados.

Ainda, o Juiz verificou que, nos autos, não consta o endereço de 28 vítimas. Ele determinou que o escrivão verifique novamente a situação dos mesmos. Inexistindo os endereços e sendo de interesse da defesa a ouvida das vítimas ou, ao menos, a comprovação de suas existências e presenças no local e na hora do fato, defiro o pleito defensivo para que o Ministério Público fale a respeito.

Cartas precatórias

Algumas vítimas serão ouvidas nas Comarcas de Uruguaiana, Horizontina, Passo Fundo, Rosário do Sul, Quaraí, com prazo, se possível, de 30 dias. Nesses casos, o Juízo de cada Comarca é que vai marcar as oitivas.

Diligências

O Juiz manteve negado o pedido de perícia no interior da boate, requerido pela defesa de um dos músicos da banda Gurizada Fandangueira, Marcelo dos Santos, em virtude de informação de que foi encontrado querosene no local. Desnecessária nova perícia em função da apreensão de um litro de querosene refinado no local, haja vista que, de acordo com o auto de apreensão, essa substância foi encontrada no teto da boate, próximo ao depósito, ou seja, na parte da frente. A localização da substância apresenta-se incompatível com o local atingido pelo fogo (lado diametralmente oposto), o que descarta o envolvimento de tal material com o incêndio, avaliou o julgador.

O músico solicitou ainda a intimação do Promotor de Justiça Ricardo Lozza, o que também foi negado. Neste momento, quando ainda nem se concluiu a ouvida das vítimas, não vislumbro fundamento para acolher o pleito. Primeiro porque como destacou o Órgão Ministerial não foi demonstrada a necessidade da oitiva de tal pessoa, a qual, inclusive, já teve sua conduta examinada pelo Órgão competente.

O pedido de intimação do Prefeito de Santa Maria Cézar Schirmer, do Deputado Estadual Jorge Pozzobon e outras duas testemunhas, que teriam participado de uma reunião, na madrugada da tragédia, com um dos proprietários da boate, também foi indeferido. A defesa não indicou as razões que recomendariam a oitiva de tais pessoas, nem qual seria o conteúdo abordado em tal reunião, não sendo possível perceber qual a relação desse episódio com os homicídios e as tentativas de homicídio que são apuradas nesses autos, asseverou o Juiz.

O magistrado também entendeu não ser necessário ouvir os bombeiros que atenderam ao sinistro na boate, conforme pedia a defesa de Marcelo dos Santos. De todo modo, se necessário, os bombeiros poderão ser chamados a prestar esclarecimentos como testemunhas do Juízo, porém, só poderá ser avaliada tal necessidade ao final da fase instrutória.

Em relação aos pedidos formulados pela defesa de Elissandro, foi autorizada a juntada do caderno contendo relatório técnico elaborado pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do RS (CREA/RS) sobre o sinistro na boate Kiss, bem como da cópia dos cadernos com anotações realizadas pelos funcionários da boate, que foram apreendidos no local e estão depositados em Juízo.

domingo, 25 de agosto de 2013

Uso do Crediscore para análise de crédito dos consumidores abre projeto

Violação de direitos ou simples ferramenta de análise de risco para concessão de crédito? Com essa indagação inicial, o Crediscore, serviço baseado em um conjunto de indicadores com diferentes variáveis que indica a probabilidade de inadimplência dos clientes, oferecido pela Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) aos varejistas, foi o tema que abriu o projeto Debates sobre Temas Polêmicos, promovido pelo Centro de Estudos do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). O evento, restrito a magistrados, servidores e estagiários, acabou ganhando a participação extra de advogados, interessados no assunto, e ocorreu nessa terça-feira (20/8) fazendo lotar o Plenário Ministro Pedro Soares Muñoz, no prédio do Tribunal, em Porto Alegre, nessa terça-feira (20/8).

O Coordenador do Centro de Estudos do TJRS, Desembargador Eugênio Facchini Neto, abriu os debates, explicando que o tema divide a opinião dos magistrados. Ele ressaltou existirem duas Ações Coletivas tramitando no Judiciário Estadual, que questionam o uso do Crediscore. Uma, foi considerada procedente e a outra, não. Sem falar nas ações individuais, às milhares. A divisão está marcada no seio da magistratura, afirmou o Desembargador.

Afronta ao Código de Defesa do Consumidor

O Juiz Gilberto Schäfer, que integra o chamado G-8, grupo de magistrados que julga ações de massa, revelou que, diariamente, ingressam no Judiciário Estadual 600 processos questionando o uso do Crediscore. Ele esclareceu que a posição do grupo é pela ilegalidade do banco de dados. Sabemos de histórias de consumidores que tiveram seu crédito negado e não sabem o motivo. O banco de dados é formado por dados de ações revisionais e informações prescritas, afirmou o Juiz. Outra questão que envolve o tema diz respeito ao dano moral. O valor das indenizações tem sido pacificado pelo G-8 em 
R$ 1.500,00. Temos estabelecido uma quantia que não é muito alta, mas que não estimule o serviço. O grupo opta também por, nesses casos, não exigir que o autor apresente a prova do dano moral.
O Desembargador Tasso Caubi Soares Delabary, que atua na 9ª Câmara Cível do TJRS, considera que o Crediscore afronta o artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que trata do acesso do consumidor às informações existentes em cadastros, fichas, registros, dados pessoais e de consumo arquivados sobre ele, bem como sobre as suas respectivas fontes. Existe uma discussão quanto à natureza do Crediscore: é um banco de dados? É um cadastro? É uma ferramenta? Talvez seja uma forma de mascarar a atividade para fugir das obrigações apontadas pelo CDC, afirmou o magistrado.
Ele acredita que falte objetividade ao sistema, que tem o dever de transparência, mas não esclarece quanto às informações exatas que nele constam. Esse banco de dados nasceu numa situação de sacralidade: ele envolve o nome do cidadão, mas é tratado apenas entre o lojista e a empresa, sob alegação de que cláusulas contratuais impedem a sua divulgação, afirmou. O crédito é uma opção do lojista. Mas o que se trata, nesses casos, é a atividade desenvolvida pela CDL que contraria o CDC, asseverou o magistrado, que questionou também o limite temporal dos dados inclusos no sistema. Então, que se abra o banco de dados e se demonstre como as informações são classificadas e avaliadas. Nem a CDL nem nenhuma outra entidade ligada à análise de crédito fizeram isso até agora, questionou o Desembargador Tasso.
O Desembargador Túlio de Oliveira Martins, da 10ª Câmara Cível do TJRS, também considera que a iniciativa fere o CDC e também o Código Civil. Destacou o quanto são valiosas as informações sobre os consumidores, usando como exemplo o recente convênio firmado entre o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Serasa, que permitiu o repasse de dados de eleitores brasileiros à empresa. O crédito não deixa de ser um elemento da base monetária; é uma moeda virtual. Estatisticamente, os dados de um indivíduo são inexpressivos. Mas de um grupo têm muito valor.

O magistrado ainda destacou a transparência das informações, cada vez mais uma exigência da sociedade. As informações são tão públicas quanto possível. O Estado brasileiro segue nesse caminho, seja pela legislação, seja por decisões judiciais. E isso deve avançar também nas relações de consumo, concluiu o Desembargador Túlio.

Demandismo
O Desembargador Ney Wiedemann Neto defendeu a legalidade do serviço oferecido pela CDL. Ele disse que tanto a 6ª Câmara Cível quanto o 3° Grupo Cível do TJRS, onde atua, se posicionam dessa forma. Mas que tudo pode mudar assim que o Superior Tribunal de Justiça decidir quanto ao encaminhamento de ações repetitivas. A 5ª e a 6ª Câmaras Cíveis estão divididas. O rumo é imprevisível. Hoje, não existe um incidente de jurisprudência que daria aos juízes uma pacificação sobre a matéria. Estamos aguardando o entendimento do STJ, afirmou o magistrado.
Na avaliação do Desembargador, o Crediscore é um serviço de consulta oferecido ao lojista que, ao consultar o sistema, obtém um índice que aponta a capacidade de endividamento do cliente. A relação contratual que se estabelece é com o lojista. É ele quem vai decidir, ressaltou. O magistrado disse ainda que vê com preocupação o demandismo das ações contra o banco de dados. Muitos autores não tiveram o crédito negado, mas receberam o convite para ingressar com as ações, muitas vezes, sem compreender o que se passa, mediante promessa de receber uma indenização, explicou. Em razão disso, muitos juízes passaram a fazer audiências de conciliação. E eu já recebi agravos onde os autores alegam que não gostariam de participar das conciliações, completou o Desembargador Wiedemann.

O Advogado da CDL Porto Alegre, Fernando Fabris, fez alguns esclarecimentos sobre o Crediscore. Disse que é oferecido aos lojistas desde 2006, que não se utiliza de dados de ações revisionais, nem de informações anteriores há cinco anos. Afirmou também que, desde 2010, quando foi concedida liminar em favor da ação ajuizada pela Associação Gaúcha de Defensores dos Interesses da Cidadania e do Consumidor (AGDICC), questionando o serviço, a entidade presta informações aos consumidores interessados em saber a respeito dos seus dados. Mas que, desde então, a procura tem sido baixa.
Fabris ressaltou ainda que os dados que integram o sistema trazem referências impessoais. Ele não está centrado nas informações pessoais do consumidor, não teria como saber tanto sobre a vida de cada um. 

Por exemplo, ele pode cruzar a idade do cliente com dados econômicos do IBGE sobre a faixa etária em que o mesmo se enquadra. Ou seja, são conclusões avaliativas de crédito.

O advogado da CDL também destacou o aumento do ingresso de ações de danos morais contra a entidade. Segundo ele, no ano passado, eram 204 processos e, até junho de 2013, já chegam a 4,9 mil. A falta de necessidade de constituir a prova e o valor das indenizações facilitam o ajuizamento das ações. A simples existência do serviço já o condena.

Sobre o convênio entre o TSE e a Serasa, disse que a iniciativa era apenas para saber o endereço dos clientes e se esses estão vivos. O convênio gerou tanta polêmica, acerca do sigilo das informações dos cidadãos, que acabou sendo suspenso pelo Tribunal Superior Eleitoral.

Fonte:STJ

sábado, 24 de agosto de 2013

Associado de plano de saúde tem direito a tratamento em casa mesmo sem previsão contratual

O ministro Luis Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), garantiu a um associado do plano de saúde da Amil Assistência Médica Internacional Ltda. o direito a tratamento médico, em regime de home care, mesmo sem cobertura específica prevista no contrato. 

Segundo o ministro, é abusiva a cláusula contratual que limita os direitos do consumidor, especificamente no que se refere ao tratamento médico. Salomão afirma que o home care não pode ser negado pelo fornecedor de serviços, porque ele nada mais é do que a continuidade do tratamento do paciente em estado grave, em internação domiciliar. 

O ministro negou provimento ao agravo interposto pela Amil para que seu recurso especial, contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), fosse admitido pelo STJ e a questão fosse reapreciada na Corte Superior. 

Revisão de provas

Segundo o ministro Salomão, não é possível rever os fundamentos que levaram o TJRJ a decidir que o associado deve receber o tratamento de que necessita para a recuperação de sua saúde, embora a operadora tenha incluído no contrato de adesão cláusula restritiva. 

“Rever os fundamentos que ensejaram esse entendimento exigiria reapreciação do conjunto fático-probatório, o que é vedado em recurso especial, ante o teor da Súmula 7 do STJ”, assinalou o ministro. 

Além disso, o ministro considerou que a indenização fixada pelo TJRJ, no valor de R$ 15 mil, por dano moral, atende aos princípios da razoabilidade e observa os parâmetros adotados pelo STJ. 

Fonte:STJ

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

STJ nega pedido de indenização por ataque a barco pesqueiro durante a Segunda Guerra

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso em que familiares de pescadores pediam indenização da República Federal da Alemanha pelo afundamento do barco Changri-lá, ocorrido no litoral de Cabo Frio (RJ), durante a Segunda Guerra Mundial. 

A Turma, especializada em direito privado, entendeu que o ataque de um estado a outro em período de guerra constitui decisão soberana, pela qual uma nação não se submete à jurisdição de outra nação. 

Em ocasiões anteriores, o STJ julgou outros recursos de familiares das vítimas do Changri-lá, nos quais aplicou a mesma tese. Em um deles, RO 66, foi apresentado recurso extraordinário para o Supremo Tribunal Federal (STF), ainda pendente de admissão pela Corte Suprema. 

Sem sobreviventes 

De acordo com os recorrentes, em 1943, o barco de pesca Changri-lá, com dez tripulantes, foi abatido a tiros de canhão pelo submarino alemão U-199, que percorria a costa brasileira. 

Os autores disseram que nenhum dos tripulantes da embarcação pesqueira sobreviveu e que, posteriormente, o submarino alemão foi abatido pelas forças brasileiras. Disseram que foram resgatados alguns sobreviventes do submarino, que, após interrogatório nos Estados Unidos, confessaram ter afundado o Changri-lá. 

Em 1944, o Tribunal Marítimo concluiu que não havia provas de que o barco pesqueiro fora afundado pelo submarino alemão e arquivou o caso. Porém, em 2001, com base em novos elementos trazidos por um historiador, o Tribunal Marítimo mudou o entendimento e concluiu que o submarino da Alemanha teria mesmo abatido o Changri-lá. 

O acórdão do Tribunal Marítimo declarou que o U-199 foi afundado pela Força Aérea Brasileira (FAB) e lembrou que, após os sobreviventes serem resgatados e interrogados, confessaram o ataque a um “veleiro”. Depois de confrontados os depoimentos com documentos de bordo existentes no U-199, concluiu-se que a embarcação atacada era o Changri-lá. 

Ato de império 

Diante dessas conclusões, foi ajuizada ação de reparação por danos morais sofridos pelos familiares dos pescadores mortos no barco. A Alemanha foi comunicada do feito e declarou sua imunidade diante da jurisdição brasileira, pois entendeu que praticou ato de império, numa ofensiva militar em período de guerra. 

A ação foi extinta sem julgamento de mérito em primeiro grau, em virtude da imunidade da República Federal da Alemanha. Os autores apresentaram então Recurso Ordinário contra a decisão. 

Alegaram que não se aplica a imunidade nas hipóteses de afronta aos direitos humanos e que não existe imunidade de jurisdição por atos praticados no território do estado do foro. 

Para a Terceira Turma, a imunidade de jurisdição não é vista de forma absoluta atualmente. De acordo com os ministros, ela é excepcionada principalmente nas hipóteses em que a causa tenha como fundo relações de natureza puramente civil, comercial ou trabalhista, ou que, de qualquer forma, se enquadre no âmbito do direito privado. 

Supremacia estatal 

Entretanto, de acordo com os ministros, quando se trata de atos praticados numa ofensiva militar em período de guerra, a imunidade é absoluta e “não comporta exceção”. 

Segundo o relator do recurso, ministro João Otávio de Noronha, mesmo com as confissões dos tripulantes e do comandante do U-199 às autoridades brasileiras e posteriormente às americanas, as afirmações “não socorrem os autores da ação, pois o prosseguimento do feito esbarra num óbice intransponível, segundo o direito atual: a supremacia estatal, perfectibilizada nos atos de império praticados pelas nações no âmbito de suas jurisdições”.

Noronha garantiu que no caso em questão a imunidade é absoluta, “pois o ato praticado pelo estado estrangeiro deu-se numa situação excepcional, qual seja: estado de guerra, em que o Brasil se posicionou contra a Alemanha”. 

Para o colegiado, nesse tipo de situação, considera-se que os ataques praticados contra o estado com o qual se guerreia são decorrentes da decisão soberana do ente estatal agressor. “Por mais irônico que possa parecer, em estado de guerra, a simples morte de alguém não é vista sob a ótica pretendida pelos recorrentes, que se aventaram na defesa dos direitos humanos”, ressaltou Noronha. 

O relator citou precedentes que confirmaram a tese adotada pela Turma, entre eles o RO 99, da lavra da ministra Nancy Andrighi; o RO 110, da ministra Isabel Gallotti, e o RO 66, da relatoria do ministro Fernando Gonçalves, que reconheceu: “Não há infelizmente como submeter a República Federal da Alemanha à jurisdição nacional para responder a ação de indenização por danos morais e materiais por ato de império daquele país, consubstanciado em afundamento de barco pesqueiro no litoral de Cabo Frio por um submarino nazista, em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial.” 

Fonte:STJ

quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Operadoras não podem estabelecer prazo de validade para créditos pré-pagos de celular

A 5.ª Turma do TRF da 1.ª Região proibiu que as operadoras de telefonia móvel estabeleçam prazo de validade para créditos pré-pagos, em todo o território nacional. A decisão unânime resulta da apreciação de recurso interposto pelo Ministério Público Federal (MPF) contra sentença da 5.ª Vara Federal do Pará que, em ação civil pública movida pelo próprio MPF contra a Anatel e as operadoras Vivo, Oi, Amazônia Celular e Tim, entendeu que a restrição temporal de validade dos créditos de celulares pré-pagos não apresenta qualquer irregularidade.

O MPF busca a nulidade, nos contratos firmados entre os usuários do serviço e as operadoras, das cláusulas que preveem a perda dos créditos adquiridos após a expiração de um decurso temporal ou condicionem a continuidade do serviço à aquisição de novos créditos. No entanto, o juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido.

Em recurso ao Tribunal, o MPF sustentou que, além da manifesta afronta ao direito de propriedade e caracterização de enriquecimento ilícito por parte das operadoras, as referidas cláusulas contratuais são abusivas, pois implicam em indevido desequilíbrio na relação entre o consumidor/usuário e as operadoras que fornecem os serviços. A Procuradoria Regional da República da 1ª Região, órgão de 2ª instância do MPF, também manifestou-se no processo, opinando pelo provimento do recurso. "O interesse que deve prevalecer é o público, ou seja, o dos usuários que são os seus verdadeiros destinatários, e não o das empresas concessionárias. A inversão desses valores, que acontece na prática, transforma a telefonia em artigo de luxo e inviabiliza a prestação do serviço público a milhares de pessoas que não dispõem de recursos financeiros para adquirir créditos de forma constante e sistemática", defendeu a procuradora regional da República Eliana Torelly.

Durante o julgamento, o relator do processo na 5.ª Turma, desembargador federal Souza Prudente sustentou que as cláusulas limitantes esbarram no Código de Defesa do Consumidor, que veda ao fornecedor condicionar o fornecimento de produtos ou de serviços ao fornecimento de outro produto ou serviço, bem como, sem justa causa, a limites quantitativos. A Anatel não pode nem deve extrapolar os limites da legislação de regência, como no caso, a possibilitar o enriquecimento ilícito das concessionárias de telefonia móvel", completou Souza Prudente.

Assim, a 5ª Turma do TRF1 acatou o recurso e o parecer do MPF para reformar a sentença, declarando nulas as cláusulas contratuais e as normas da Anatel que estipulem a perda dos créditos adquiridos após a expiração de determinado decurso de tempo ou que condicionem a continuidade do serviço à aquisição de novos créditos. Proibiu, ainda, que as operadoras Vivo, Oi, Amazônia Celular e Tim subtraiam créditos ou imponham prazos de validade para sua utilização, devendo as empresas reativar, no prazo de 30 dias, o serviço de todos os usuários que o tiveram interrompido, restituindo a eles a exata quantia em saldo existente à época da suspensão dos créditos. A decisão deve ser cumprida em todo o território nacional, sob pena de multa diária no valor de R$ 50 mil reais.

Fonte:jusBrasil

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Benefícios da gratuidade judiciária incluem honorários de perito

Em caso de perícia técnica solicitada por quem seja beneficiário de assistência judiciária gratuita, se o perito não aceita aguardar o fim do processo para receber seus honorários, o juiz deve nomear um novo perito, servidor de órgão público, para a produção das provas. Este foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ). 

O autor entrou com ação cautelar de produção antecipada de prova depois de ter adquirido uma barra de cereais e supostamente ter encontrado nela “teias de aranha, ovos, restos de insetos e larvas”. Ele afirmou que a produção antecipada de prova – para instruir ação indenizatória que seria ajuizada posteriormente contra o fabricante – seria fundamental por se tratar de alimento perecível. 

Ainda que tenha reconhecido o autor da ação como beneficiário da Justiça gratuita, o juiz de primeiro grau determinou que ele arcasse com o pagamento dos honorários periciais. O tribunal estadual manteve a sentença, ao argumento de que não se pode obrigar o perito, não pertencente ao quadro de servidores do Judiciário, a fazer o trabalho sem remuneração. 

O consumidor recorreu então ao STJ, alegando que, por ser beneficiário da Justiça gratuita, deve ser isento do pagamento. 

A ministra Nancy Andrighi, relatora do processo no STJ, reconheceu que, quando requerida, a perícia deve ser paga por quem a requereu ou de acordo com a determinação do juiz, porém a Lei 1.060/50, que regula a assistência judiciária gratuita, em seu artigo 3º, explicita que os honorários do perito também fazem parte dessa assistência. 

Não adiantamento 

O caso julgado na Terceira Turma não trata da responsabilidade definitiva pelo pagamento, mas de seu adiantamento, uma vez que a sentença é que imporá ao vencido na demanda o pagamento das despesas do processo. Em sua decisão, a ministra Nancy Andrighi afirmou que os honorários periciais não devem ser adiantados pelo beneficiário da assistência judiciária gratuita nem pela outra parte, que não requereu a prova pericial. 

“Os honorários periciais serão pagos ao final, pelo vencido ou pelo estado, se o vencido for beneficiário da Justiça gratuita. Não concordando o perito com o recebimento dos honorários apenas ao final, o estado, através de seus órgãos públicos, deve arcar com a realização do exame pericial, em colaboração com o Poder Judiciário”, afirmou a relatora. 

A decisão unânime da Terceira Turma declara que o depósito prévio dos honorários do perito para realização da prova pericial não pode ser exigido. Caso o especialista indicado anteriormente pelo juiz não concorde em aguardar o fim do processo para receber seus honorários, um novo perito deve ser escolhido entre técnicos de órgão público. ]

Fonte:STJ

terça-feira, 20 de agosto de 2013

Devolução de carta com AR não basta para permitir redirecionamento de execução fiscal contra o sócio

O redirecionamento de execução fiscal só é cabível quando fica comprovado que o sócio-gerente da empresa agiu com excesso de poderes, infração à lei, contrato social ou estatuto, ou no caso de dissolução irregular da empresa. Com esse entendimento, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) rejeitou recurso da Fazenda Nacional contra uma empresa do Nordeste. 

A Fazenda recorreu ao STJ contra decisão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5), que determinou a exclusão do sócio-gerente do polo passivo por entender que a devolução de correspondência enviada com Aviso de Recebimento (AR) não basta para caracterizar dissolução irregular, o que possibilitaria o redirecionamento. 

O ministro Humberto Martins, relator do recurso, destacou os fundamentos do TRF5 ao apreciar a questão: “A responsabilidade do sócio pelos tributos devidos pela sociedade, ou redirecionamento, como preferem alguns doutrinadores e juízes, não é absoluta, segundo informam os artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional. Ao contrário, a regra é a irresponsabilidade.”

O tribunal de origem salientou ainda que a responsabilidade não é objetiva, devendo estar configurado nos autos o agir excessivo ou ilegal do sócio. 

Em seu voto, Humberto Martins destacou que a simples devolução de carta por AR não configura prova de dissolução irregular. Segundo o ministro, a decisão do TRF5 afirmou que não há indícios de dissolução irregular da empresa executada, assim como o sócio-gerente não agiu com excessos de poderes ou infrações à lei ou estatuto social, o que impossibilita o redirecionamento da execução fiscal. 

Quanto à alegação da Fazenda de que haveria nos autos outros indícios de dissolução irregular da empresa, isso não pôde ser analisado pelo STJ porque implicaria reexame de provas em recurso especial, o que é proibido pela Súmula 7. 

Fonte;STJ

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Exercício de mandato eletivo não impõe cassação de aposentadoria por invalidez

O exercício de cargo eletivo não representa atividade laboral remunerada para fins de cassação de aposentadoria por invalidez. Esse foi o entendimento aplicado pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao negar provimento a recurso especial do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) contra um vereador do Ceará. 

Em 1997, o beneficiário foi alvejado na região da coluna cervical por disparo de arma de fogo durante um assalto à agência bancária em que trabalhava. Aposentou-se por invalidez. Nas eleições de 2004, foi eleito para o cargo de vereador da cidade de Pacatuba (CE), para o mandato de 2005 a 2008. 

Aposentadoria cancelada 

Em 2010, o INSS cancelou a aposentadoria por invalidez do ex-vereador. No entendimento da autarquia, o fato de o segurado ter exercido o mandato eletivo configurou retorno à atividade laboral, o que determinou a cessação do benefício. 

O ex-vereador recorreu à Justiça e ganhou o direito ao restabelecimento da aposentadoria por invalidez em primeira e segunda instância. O INSS recorreu ao STJ. 

Percepção conjunta 

Ao analisar o recurso, o ministro Benedito Gonçalves, relator, entendeu que o exercício de cargo eletivo, com mandato por tempo determinado, não configura retorno às atividades laborais do segurado, nem comprova aptidão para o trabalho exercido antes da invalidez. 

O ministro destacou ainda que, para que haja a cessação e o retorno do segurado à atividade laboral, deve ser observado o procedimento disposto no artigo 47 da Lei 8.213/91.  



A Primeira Turma, em decisão unânime, admitiu a percepção conjunta do subsídio decorrente do exercício de mandato eletivo e do provento de aposentadoria por invalidez, pois têm natureza diversa, e a incapacidade para o trabalho não significa, necessariamente, invalidez para os atos da vida política. 

Fonte:STJ

domingo, 18 de agosto de 2013

Juiz não é gestor nem gerente. Ele deve julgar. E bem!

Um pouco de história
Como pensávamos antes de 1988? O que mudou no imaginário dos juristas desde então? Esta é uma pergunta que os alunos costumam fazer. Veja-se que, por exemplo, promulgada a nova Constituição em 1988, a composição do Supremo Tribunal Federal continuou a mesma. Repetimos o que já havíamos feito na Constituição de 1824, recepcionando os conselheiros da Casa de Suplicação. E repetimos o que fizemos em 1891, quando, já na República, sob a égide da nova Constituição constituímos o Supremo Tribunal com os antigos conselheiros do velho Superior Tribunal de Justiça. Com isso, tornaram-se ministros do STF republicano dois “nobres”, com título e tudo.

Na verdade, nunca tivemos grandes rupturas. Acostumamo-nos a ver o novo com os olhos do velho. Imaginemos os velhos conselheiros, novéis ministros do STF da República, julgando inconstitucionalidades, coisa que não existia no Império. Pouco pode nos surpreender, quando falamos em “questões paradigmáticas”.

Antes da CF 88, a não democracia. A ditadura. O regime autoritário. A luta do jurista crítico era contra essa estrutura jurídica “que aí estava”. Se ele não fosse para a política (ou para outro tipo de luta), tinha que lutar dentro da institucionalidade. Ou seja, nas brechas da institucionalidade, o jurista “de oposição” (não partidária, mas de oposição ao autoritarismo) tinha que se desdobrar para levar adiante e ter êxito nos seus pleitos (habeas corpus, mandados de segurança etc.). Correntes críticas de várias tendências se formaram. O realismo jurídico deu azo às posturas ditas alternativas. Um certo marxismo concebeu o “direito achado na rua”. As correntes linguísticas buscavam nas brechas do texto legal, repleto de vaguezas e ambiguidades, o direito de seus clientes. Outras posturas, sem maior filiação epistêmica, faziam do axiologismo um modo de ultrapassar as barreiras ônticas da estrutura autoritária do sistema implantado pelo regime militar. Veja-se, por exemplo, a importância (até) de um positivista-axiologista como Recasens Siches, para mostrar as insuficiências do positivismo formal(ista). No fundo, qualquer um que se colocasse contra o formalismo legal era considerado aliado, desde que, teleologicamente, suas posições fossem contra o establishment.

E chegamos à democracia
E assim conquistou-se a democracia. E construímos a Constituição, que albergou a expressiva maioria de nossos pleitos. Na dúvida, emplacamos tudo no texto da Constituição. Afinal, se nem a lei se respeitava, quem sabe o novo regime pós/88 respeitaria o texto da Constituição? Veja-se que, já então, apostava-se em uma nova textualidade. Claro que não uma textualidade exegética, e, sim, uma nova, daquelas que fizeram com que, na Europa, os juristas progressistas que se forjaram no direito pós-bélico (pós 1945) passassem a apostar em um certo objetivismo do texto constitucional, aquilo que Elias Diaz chamará, depois, de “legalidade constitucional”.

Passados 25 anos, como estamos? Continuamos com o velho Código Penal, que tantas vítimas já fez e vem fazendo. Sim, esse mesmo CP que privilegia a propriedade em detrimento da vida e que pune com mais rigor os crimes interindividuais do que os crimes metaindividuais. O velho CPC, que sempre apostou no protagonismo judicial (ah, o dano causado pelo instrumentalismo processual!), depois de todo o estrago já causado, agora será substituído por um novo código, repristinando os velhos defeitos, com a agravante de querer a duras penas “commonlizar” nosso sistema — tido ainda como da família romano-germânica. O novo texto não conseguiu se livrar, por exemplo, do livre convencimento e dos embargos declaratórios, só para falar desses dois sintomas do “problema paradigmático” que aflige nosso direito. Já o velho Código de Processo Penal não tem jeito mesmo. Nos últimos tempos, a grande inovação (positiva) não vem sendo cumprida pelo Judiciário. Ou seja, o artigo 212, ao institucionalizar o sistema acusatório, acabou letra morta, com os juízes continuando a produzir prova, como no tempo de Abrantes. O projeto do novo CPP? Repete os mesmo erros do velho, como se o tempo não tivesse passado... Nem vou falar do Código Civil, paraíso das cláusulas abertas, espaço privilegiado da discricionariedade. Nem vou falar do Código do Consumidor, que “colocou” o call center dentro do Poder Judiciário (palavras do ministro Luis Salomão, do STJ). E o Direito Tributário? Virou o paraíso das invenções hermenêuticas. Tem até “ponderação de regras”, postulados, “normas-regras” (o que seria isso?), para dizer o mínimo.

A ressaca teorética
Isso tudo porque, promulgada a Constituição, passamos por uma ressaca. Ainda inseridos no antigo imaginário (formalismo versus “qualquer postura apta a derrotar esse inimigo comum), demoramos a perceber a necessidade de uma (nova) teoria das fontes, uma (nova) teoria da norma, uma nova teoria que desse conta da interpretação da Constituição e, finalmente, uma teoria da decisão, para impedir que, nesse novo patamar, passássemos a decidir de qualquer modo, ainda com o olho nos velhos dilemas.

Nesse contexto, importamos, de forma equivocada (porque descontextualizada), a jurisprudência dos valores, a teoria da argumentação jurídica (cuja vulgata possibilitou o uso indiscriminado da ponderação, essa doença contemporânea da interpretação) e o ativismo judicial de origem norte-americana (como se os ativismos de lá fossem “sentimentos constitucionais” e não meramente contingenciais em face das composições da US Supreme Court).

Resultado disso: uma aplicação do direito fragmentada, dando vazão aos “sentimentos pessoais” de cada julgador. No STF, não é difícil perceber isso, a partir da tese, repetida ad nauseam, de que “o juiz primeiro decide e depois busca o fundamento” ou que “a interpretação da lei é um ato de vontade”, como se isso fosse uma novidade e não fosse algo dito por Kelsen em contexto totalmente diferente (com efeitos colaterais desastrosos!).

Claro que o establishment deu uma resposta darwiniana a esse estado de natureza interpretativo, em que uma portaria ainda vale mais do que a Constituição e em que não é difícil ver decisões que, em um dia, negam a insignificância em R$ 80 e, dias depois, a deferem em valores superiores a R$ 1 mil. E qual foi ou tem sido a resposta? Súmulas vinculantes, repercussão geral, recursos repetitivos, “commonlização” do sistema e criação sistemática de mecanismos conhecidos como “jurisprudência defensiva”, como alertado recentemente por José Miguel Garcia Medina aqui mesmo na ConJur (clique aqui para ler), para evitar que a malta leve seus pleitos aos Tribunais Superiores.

A crise da Justiça é questão de “gestão”? Não! Juiz não é gestor!
Esse terreno é fértil para o surgimento de soluções no plano das neoteorias jurídicas, como por exemplo, apostar na “indústria” das efetividades quantitativas. Tudo para que se julgue teses e não mais causas. Tudo para que se julgue por atacado. Eis o campo para o florescimento das teorias da “gestão”. Solução mágica que “vende muito por aí”. Sim, a solução é a gestão dos processos. Há problemas na aplicação do Direito? Bingo: venha estudar gestão em pós-graduação. Tem agora até MBA. “Juiz deve ser gestor”, como tenho lido em muitos textos e folders propagandeando novos cursos de especialização e mestrados profissionalizantes.

Nesse sentido, li na Folha de S.Paulo do último dia 3 de agosto, que juízes devem investir em gestão para agilizar processos. O ilustre professor Pablo Cerdeira, da FGV, considera que a saída para o problema da morosidade da Justiça é os juízes aprenderem “gestão”. Como ninguém tinha pensado nisso antes? Para que estudar Teoria do Direito, saber jurisdição constitucional, a diferença entre regras e princípios, se a saída está em saber gerenciar os processos? Claro que as neoteorias que apostam na gestão não se restringem à “questão da agilização”. Na verdade, a onda é colocar a gestão para além disso, ou seja, a aposta na gestão vem assumindo um caráter substancial. E nisso mora o perigo. O meio se transforma em fim...

E isso “pega”. O CNJ gosta dessas coisas. E estipula metas. Tudo vira estatística. Ouvi falar que um juiz estadual precisa preencher todo mês nada menos que 13 relatórios! E os cursos de pós-graduação em gestão aproveitam para vender seu peixe. Ao invés de estudar Konrad Hesse e Gadamer, estudemos formas de fazer o processo ir de estagiário a estagiário, passando por um gerenciamento por temas. E como já há decisões padronizadas, basta que se gerencie esse modelo aplicativo. Por exemplo, como diz o professor Cerdeira, protagonista da matéria, na medida em que o TJ do Amazonas não alcançou as metas do CNJ, isso foi assim porque não adotou processos integralmente digitais. Pronto. Eis a solução para o Amazonas. E para todo o Brasil. Somando processos totalmente digitais com gestão, teremos o nirvana processual. Nas Faculdades, nem precisaremos mais estudar processos civil ou penal. Direitos fundamentais, nem falar... O lema é: “Não precisamos mais de um bom juiz: precisamos de um bom gestor”. Promotor de Justiça, defensor, procurador? Para quê? Basta um bom “juiz gestor”! E se ele tiver pós-graduação em gestão, melhor ainda. Estará treinado.

O que quero dizer é que não estou dispensando ou menosprezando a importância de que alguém faça uma otimização dos modos como se distribuem tarefas em um determinado gabinete. Ninguém pode trabalhar de forma desorganizada. Não sou ingênuo para não reconhecer a utilidade das novas tecnologias. Mas colocar esses instrumentos como um fim é, exatamente, deslocar a discussão da qualidade para a quantidade.

De há muito perdemos o sentido do que seja “uma decisão jurídica adequada”. E já vejo dissertações de mestrado e até teses de doutorado encantadas com esse deslocamento. No fundo, mal sabem os adeptos dessas neoteorias que esses modelos são meramente procedimentais. Kelsen era melhor que eles. A ele não importava a qualidade da decisões. Aliás, para ele juízes não faziam ciência. Faziam política jurídica. Então, para Kelsen — que ninguém mais estuda, porque o melhor é, pós-modernamente (sem que saiba o que é essa palavra), estudar coisas como “gestão” — não importa o acerto ou o erro ou o “justo ou o injusto”.[1] Cada juiz, em Kelsen, produz uma norma individual. Que vale, porque ele está autorizado para isso. E se o sistema não corrigir, vale até mesmo a sentença mais absurda. Qual é a diferença dessa cisão kelseniana (entre direito e ciência do direito) com a total procedimentalização das decisões judiciais?

Aliás, essa questão da ênfase na gestão assume ares de dramaticidade, se colocarmos a discussão face aos recentes problemas do Exame de Ordem da OAB. Pergunto: Como ficaria a tese da gestão aplicada à falta de qualidade das questões do Exame de Ordem? Ou a tese da gestão não se aplica ao “sistema” de elaboração das perguntas feitas à malta que quer ser advogado? Pergunto isso porque a mesma instituição que aplica o Exame de Ordem é a instituição que mais aposta na “questão da gestão”, como se pode ver na matéria assinada pelo professor Cerdeira.

Fico pensando na Medicina. O aluno, em vez de fazer uma tese sobre as complexidades de uma operação cardíaca, é instado pelo seu professor-orientador a fazer uma coisa mais gerencial, ou seja, escrever sobre o bisturi e sua eficácia (ou sobre a entrada e saída de pacientes da UTI). Capítulo primeiro, a história do aço; capítulo segundo, a sua invenção; capítulo terceiro, sua função; capítulo final (conclusão genial): “sem bisturi não dá para operar”. Bingo!

A crise do (e no) Direito decorre de falta de gestão ou falta de reflexão?
Em conversas com magistrados por todo o Brasil, os mais atentos já perceberam que esse discurso de juiz gestor é para anestesiá-los, para desfocar o real problema: a concentração de recursos nas cúpulas e o abandono, em especial, da Justiça de primeira instância. Na verdade, a Reforma do Judiciário só ajeitou o reboco do edifício. Não mexeu nas estruturas. E sem essa mexida não haverá resultados significativos. Transformar o juiz em gerente de entreposto judiciário, sem enfrentar a questão hermenêutica, é engodo. Serve para o exercício da vontade de poder das cúpulas e em benefício do estamento sempre próximo.

Não sei se tenho paciência para continuar a discutir “coisas republicanas”. Sinceramente, não sei. A cada semana, novas denúncias de uso de aviões, passagens etc. Até o vice-presidente da Câmara usa jatinhos do Projeto Bolsa FAB. E a desculpa: tem uma instrução normativa que autoriza (veja-se o modo como são usadas e criadas “cotas de passagens aéreas” para ministros do STJ). Ah, bom. Basta uma portaria ou uma resolução. Bingo! Feita por quem? E não há teoria das fontes? Não há controle de legalidade-constitucionalidade? Ainda é possível dizer que uma “norma” é legal, mas imoral? Para que serve o princípio da moralidade? Estamos, por acaso, na era em que direito e moral estão cindidos? Basta estar na lei que está “legal”? Então não serviu para nada a virada copernicana ocorrida no Direito após o segundo pós-guerra? Veja-se, pois, do que precisam saber nossos juízes e promotores... Estudar os grandes conceitos do direito. É disso que precisamos.

Claro: para que estudar isso? Parece que, segundo as neoteorias, melhor do que estudar a boa doutrina e aprofundar-se na reflexão jurídica é estudar a informática no Direito, novas formas de gerenciamento de processos, novas estatísticas e criar mecanismos para impedir a subida de recursos. É isso. Tudo se transforma em números: tenho um pé nas brasas e outro no gelo — na média, temperatura ideal... Por sinal, o brilhante Otavio Luiz Rodrigues Junior, na sua Coluna do dia 7 de agosto (clique aqui para ler), faz uma adequada crítica a uma espécie de neoteoria que está se proliferando no país, que ele chama de “onda da empiria”, isto é, feita por aqueles que pensam que só se pode falar do e sobre o Direito a partir de dados empírico-jurisprudenciais. No fundo, trata-se de um “gerenciamento de dados”, aproximando as teorias que apostam na gestão com aquilo que é o seu instrumento: dados numérico-estatísticos. Em meu novo Jurisdição Constitucional e Decisão Juridica (RT, 2013, páginas 290-295), mostro como determinada pesquisa sobre os julgamentos do STF pode ser lida inversamente, ou seja, com os mesmos números provo o contrário do que a autora queria demonstrar. Esse problema também invade a ciência política, que, em muitos casos, vem adotando a tática de check list para tentar demonstrar determinadas teses (ou projeções).

Da série “há algo mais nos céus do que os aviões de carreira”, poderia perguntar se seria um problema de “gestão” ou “falta de gestão” a fragilidade com que foram aplicadas, no julgamento da Ação Penal 470, teses como do domínio do fato ou “o princípio da livre apreciação da prova”? Afinal, a crise do Direito é de que ordem?

Quando um banqueiro — que dá um “cano” de mais de R$ 3 bilhões — viaja para o exterior, com autorização judicial e vai esquiar estroinando da malta, isso é um problema de gestão ou um problema de decisão (ou decisão equivocada)? Juiz deve aprender a gerenciar processos ou a julgá-los de acordo com o direito? Eis a questão! Ainda: os mais de 8 mil homicídios por ano que não são sequer investigados são um problema de gestão ou um problema de falta de estrutura, desvirtuamento de função e incompetência individual? A humilhação daquele estagiário e o consequente arquivamento do feito é um problema de gestão?

Esse é o nosso país. Não estou, por óbvio, colocando “a culpa” da crise do e no Direito em quem aposta na “gestão”. É claro que não. O que quero dizer é que não devemos crer que, no meio de um grande tiroteio que é a crise da operacionalidade do Direito, apareça alguém com uma solução de caráter procedimental e queira “acabar com a discussão”. Se gestão resolvesse, a prova da Ordem não seria desse nível. Então, por favor, não me tirem de bobo com soluções mágicas. Perguntemos por aí como anda a operacionalidade do Direito...

O que temos de fazer é estudar. Mudar os cursos jurídicos. Parar de ensinar conceito prêt-à-porter, prêt-à-penser, prêt-à-parler. Chega de simplificar livros. Paremos com a ficção. O maior exemplo do fracasso disso tudo em terrae brasilis é o último exame de Ordem, em que, em um exemplo de furto, apareceu um comprador, paraguaio, terceiro de boa-fé (sic) e, em uma perseguição ininterrupta, a ladra teve tempo para esconder o carro cleptado, indo depois até a fronteira do Paraguai, para vender o carro... Nada mais precisa ser dito depois disso.

A crise em três dimensões
Uma palavra final: há muito tempo, li um texto do Diogo Figueiredo Moreira Neto, em que ele mostrava que uma crise deve ser analisada sob três âmbitos: estrutural, funcional e individual. Vamos trazer isso para o caos do trânsito. Não adianta construir rodovias ou abrir novas ruas, se não cuidarmos da função, isto é, semáforos inteligentes, passarelas, túneis etc; mas também não adianta tratarmos da estrutura e da função, se tivermos péssimos motoristas...

Isto é: não adianta abrir novos tribunais, contratar milhares de estagiários, novos computadores, se não tratarmos do problema da funcionalidade do processo. Mas, por favor, de nada adianta arrumarmos a estrutura e a função, se não tivermos bons “operadores” desse sistema. E isso, lamento dizer àqueles que apostam em “formulismos”, depende da ciência jurídica. Depende de um bom ensino jurídico. De bons concursos. De provas do exame da Ordem sem pegadinhas. Depende, pois, da reflexão. Depende da Teoria do Direito, da Constituição, do Processo... E não de “gestão”. Vamos parar com esse neodiscurso “eficientista”. Vejam até onde ele está nos levando. Juiz não é gerente. Juiz é julgador! Tem de aprender a decidir. E bem. Quem faz mapa é cartógrafo. Quem faz estatística é matemático (ou algo do gênero). Juiz tem de saber processo. Teoria. Tem de saber o que é isto: o Direito. É isso!

sábado, 17 de agosto de 2013

Prescrição de indenização por morte conta do óbito e não do acidente que o motivou

O prazo prescricional para reclamar indenização decorrente de morte é contado a partir da data do falecimento da vítima e não do acidente que o causou. Foi com esse entendimento que a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial de uma empresa que alegava prescrição de ação indenizatória. 

A ação ordinária foi movida por uma mãe contra empresa proprietária do veiculo que atropelou e matou sua filha. A sentença julgou improcedente o pedido com fundamento na prescrição. De acordo com o juízo de primeiro grau, tendo transcorrido mais de três anos entre o atropelamento (27 de março de 2004) e a propositura da ação (9 de abril de 2007), estaria prescrita a pretensão indenizatória. 

Sentença reformada 

O tribunal de segunda instância, contudo, reformou a sentença. De acordo com o acórdão, o prazo prescricional da ação deveria ser contado da data em que ocorreu o óbito da vítima (9 de abril de 2004), não do atropelamento. 

O recurso especial da empresa não foi admitido na origem. A discussão chegou ao STJ por força de agravo e o relator, ministro Sidnei Beneti, ratificou a decisão do acórdão de segunda instância. 

Em seu voto, Beneti destacou o que já é entendimento pacificado no STJ: “As duas Turmas que compõem a Segunda Seção desta Corte já se manifestaram no sentido de que a fluência do lapso prescricional, em casos como o presente, não se inicia da data do acidente, mas sim na data em que a vítima efetivamente vem a óbito. Não se pode tomar por ocorrido o evento morte quando pode haver apenas lesões corporais”, disse. 

Fonte:STJ

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Defeito em mercadoria e atraso na entrega de compra pela internet gera dever de indenizar

A Primeira Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul condenou a rede Carrefour a pagar indenização por danos morais para consumidor. O cliente havia comprado um carro de bebê e uma cadeira de automóvel pelo site do supermercado, mas os produtos apresentavam defeito e não foram devolvidos em tempo hábil. A decisão confirmou a sentença do 1º Grau.
Caso
O consumidor havia comprado um carro de bebê e uma cadeira de automóvel pelo site do supermercado na Internet, mas os produtos estavam com defeitos. O cliente, então, devolveu os objetos e aguardou a troca. Mais de trinta dias depois, as compras não haviam sido repostas. Buscando uma solução, recorreu ao Juizado Especial Cível de Canoas, o qual notificou o supermercado.
Em resposta, o Carrefour assumiu que não possuía mais os bens em seu estoque e ofereceu como recomposição a devolução do valor pago. A empresa, no entanto, não se pronunciou em relação ao defeito e à devolução dos produtos.
Sentença
No Juízo do 1º Grau, o Carrefour foi condenado a ressarcir o consumidor em R$ 664,64, equivalente ao valor pago pelos bens, e indenização por danos morais no valor de R$ 1.200,00, ambos corrigidos.
Inconformado com o valor da indenização, o supermercado recorreu da decisão.
Recurso
A relatora do processo, Juíza de direito Marta Borges Ortiz, confirmou a decisão homologada em 1º Grau. Em seu voto, afirmou que o valor da indenização deve ser fixado de modo a não garantir ao prejudicado apenas a reparação do dano sofrido, mas também servir de advertência a quem efetuou a conduta reprovável.
Por fim, ainda determinou que o Carrefour pagasse as despesas honorárias ao procurador do consumidor, fixadas em 20% sobre o valor da condenação.
Os Juízes de Direito Lucas Maltez Kachny e Pedro Luiz Pozza acompanharam o voto da relatora.

Fonte:STJ

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

STJ define obrigações do Serasa com os consumidores

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu parcial provimento ao recurso da Serasa S/A para livrar a empresa de algumas condenações impostas pela Justiça de Mato Grosso do Sul no julgamento de ação civil pública. A decisão estabelece o que a entidade de proteção ao crédito pode e não pode fazer. 

Entre as condenações suspensas estão a exigibilidade de documento formal de seus clientes (bancos, lojas, empresas e outros) que ateste a existência aparente de dívida ou informação restritivas. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, destacou que a jurisprudência do STJ é no sentido de que aos bancos de dados e cadastros de inadimplentes cabe apenas a anotação das informações passadas pelos credores, não sendo de sua alçada a confirmação dos dados fornecidos. 

“O banco de dados responde pela notificação e pela inserção do nome do devedor no cadastro, não cabendo a eles a confirmação de tais dados”, afirmou Salomão. 

Dados públicos 

O Serasa também não precisa notificar o devedor acerca de informações pertencentes a cartórios de protesto de títulos e de distribuição judicial, mesmo quando não possuir os endereços dos inadimplentes cadastrados. Nesse caso, o STJ avalia que esses são bancos de dados são públicos, de forma que a informação sobre a inadimplência é notória, o que afasta o dever de notificação. 

Também foi afastada a exclusão obrigatória de anotação/suspensão oriunda de débito que está sendo discutido em juízo. A jurisprudência do STJ estabelece que a simples discussão judicial da dívida não é suficiente para impedir ou remover a negativação do devedor nos bancos de dados. 

Por fim, a Turma decidiu que não é necessário notificar o consumidor de inscrição no cadastro de devedores por meio de carta registrada com aviso de recebimento (AR). Em julgamento de recurso sob o rito dos repetitivos (artigo 543-C do Código Civil), o STJ decidiu que basta o envio de correspondência dirigida ao endereço fornecido pelo credor para notificar o consumidor, sendo desnecessário aviso de recebimento. Esse é o teor da Súmula 404/STJ. 

Obrigações do Serasa 

A Turma manteve muitas das obrigações estabelecidas na condenação contestada pelo Serasa. A empresa deve excluir de seu banco de dados nomes de consumidores com débitos já pagos ou prescritos e, ainda, que tenham as informações negativas inscritas há mais de cinco anos. Também está proibida de fornecer qualquer informação que possa impedir ou dificultar novo acesso ao crédito a esses devedores. 

O Serasa deve comunicar por escrito ao consumidor sua inscrição em qualquer cadastro, inclusive aos que já constam em seus banco de dados. Também deve ser notificada a negativação por emissão de cheque sem fundos. Isso porque, diferentemente dos cadastros públicos, dados obtidos no Banco Central são de acesso restrito. 

A empresa tem obrigação de retirar de seu cadastro o nome do consumidor que comprovar diretamente ao Serasa a existência de erro ou inexatidão sobre dado informado, independentemente de manifestação dos credores. 

A ação 

O Ministério Público do Estado do Mato Grosso do Sul ajuizou ação civil pública contra a Serasa. Sustentou que, com base em inquérito civil público, apurou a capitalização de juros abusivos, bem como a prática de cobrança vexatória e irregularidades na inscrição de consumidores nos cadastros do órgão de forma ilegal. 

Em primeiro e segundo grau, os pedidos formulados pelo MP estadual na ação civil pública foram julgados procedentes para condenar o Serasa nas obrigações de fazer e não fazer, ficando estabelecida multa diária de R$ 5 mil para cada inexecução das determinações contidas na sentença, a partir do trânsito em julgado, ressalvadas as sanções penais cabíveis. 

No recurso ao STJ, a defesa do Serasa sustentou diversas violações legais, inclusive ao artigo 43 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), que trata do acesso do consumidor a informações sobre ele existentes em cadastros. 

Multa 

A Turma, por maioria de votos, também reformou decisão que fixou uma multa diária no valor de R$ 5 mil por descumprimento da ordem judicial. Para o colegiado, a multa diária por qualquer descumprimento deve constar do título executivo judicial, em que se reconhecem as obrigações de fazer e não fazer, mas deve ser fixada ao prudente e razoável arbítrio do juiz da execução. 

Os ministros Luis Felipe Salomão e Antônio Carlos Ferreira ficaram vencidos nesta parte. Eles votaram pela manutenção do valor da multa em caso de descumprimento das obrigações mantidas pelo STJ. 

Fonte:STJ

quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Ministério Público pode propor ação para anular concurso público ilegal, imoral ou inacessível

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o Ministério Público possui legitimidade para propor ação com objetivo de anular concurso realizado sem observância dos princípios estabelecidos na Constituição Federal (CF). 

O entendimento se deu no julgamento do recurso apresentado pelo MP contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). No primeiro grau, o MP ajuizou ação civil pública para ter acesso aos critérios de correção de provas do concurso de admissão e matrícula do curso de formação de oficiais da Escola de Administração do Exército (EsAEx). 

O tribunal federal considerou que o Ministério Público não tem legitimidade para propor a ação, pois, segundo o colegiado, tal pretensão é de interesse individual homogêneo. 

Meritocracia 

Para o relator do recurso, ministro Herman Benjamin, as duas características essenciais do concurso público “impõem” o reconhecimento da legitimidade na causa: “ser concurso, o que implica genuína competição, sem cartas marcadas, e ser público, no duplo sentido de certame transparente e de controle amplo de sua integridade”. 

“Concurso público é o principal instrumento de garantia do sistema de meritocracia na organização estatal, um dos pilares dorsais do Estado Social de Direito brasileiro, condensado e concretizado na Constituição Federal de 1988”, afirmou o ministro. 

Conforme precedente da própria relatoria de Benjamin, a legitimidade do MP para propor ações com intuito de resguardar tais interesses é entendimento pacífico na Corte. No Recurso Especial 1.338.916, o ministro observou que o STJ é firme em reconhecer a legitimidade do órgão para apresentar ação civil pública que vise anular concurso realizado “sem a observância dos princípios constitucionais da legalidade, da acessibilidade e da moralidade”. 

Fonte:STJ

terça-feira, 13 de agosto de 2013

Mãe biológica e mãe adotante para dois meninos gaúchos

Possivelmente inéditos nos anais da Justiça brasileira o caso e o desfecho dados a uma ação de família. Em São Francisco de Assis (RS), a mulher que cria dois meninos há sete anos - depois da morte da mãe biológica (ocorrida em 2006) - ingressou em Juízo, juntamente com os dois menores.

Os três pediram, em ação declaratória, que fosse declarada a maternidade da mãe sócio-afetiva, sem exclusão da mãe biológica - e acrescentando-se, também, mais um casal de avós maternos. As crianças passam a ter formalmente, assim, um pai, duas mães, avô e avó paternos e dois casais de avós maternos.

Ajuizada a ação em setembro de 2012, o juiz Luis Filipe Lemos Almeida, titular da comarca, declarou-se suspeito por foro íntimo, considerando o vínculo de amizade com o pai dos meninos. Admitiu ainda o juiz Almeida reputar, ele próprio, "ser testemunha na acepção jurídica do vínculo afetivo da mulher com os menores, o que certamente me influenciaria no julgamento da questão".

O processo foi passado para a juíza Carine Labres, da comarca de Cacequi (RS). Ela entendeu que "o pedido, em síntese, caracteriza hipótese de adoção, mas sem exclusão da mãe biológica, não havendo norma expressa no ordenamento jurídico que respalde a pretensão".

Mas a magistrada - numa bela e humana sentença - abraçou a conclusão de que "o Judiciário não pode fechar os olhos para a realidade fenomênica".

A juíza escreveu ter concluído que a interpretação da lei, deve levar em consideração os postulados maiores do direito universal, "observando a imprescindibilidade da prevalência dos interesses dos menores sobre quaisquer outros, até porque está em jogo o próprio direito de filiação, do qual decorrem as mais diversas consequências que refletem para toda a vida de qualquer indivíduo".

Durante a tramitação da ação foi realizado estudo social e foram ouvidas a própria mãe adotante e várias testemunhas residentes na cidade de 20 mil habitantes, onde o pai - que ficara viúvo - é advogado de destaque.

Os próprios infantes - um atualmente com 14 anos, o outro com sete - depuseram convictamente de que desejavam "manter o registro de homenagem à mãe biológica e também como reconhecimento à pessoa que os amparou quando mais precisaram".

Um ano e alguns meses depois do óbito, o viúvo passou a namorar a mulher que levou adiante a criação das crianças. O homem e a mulher estão, agora, casados.

A sentença arremata questionando: "Por que não pode haver duas mães em uma certidão de nascimento, se as crianças, no íntimo de seus corações, as reconhecem como tal?”
O processo tramita sem segredo de justiça. A manifestação do Ministério Público foi pela procedência integral da ação.

A opção de não divulgar os nomes das partes foi do editor. (Proc. nº 112.00012218).

Fonte:EspaçoVital

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